Sobre uma organização memética da política1

Roberto Winter, 2016

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Se é verdade que, como teria alertado Walter Benjamin, por trás de todo fascismo há uma revolução fracassada, faz-se urgente avaliar os mais recentes fracassos. Provavelmente não seria apenas o fracasso de uma “esquerda tradicional”, mas o fracasso de uma longa série de revoltas, levantes ou insurreições que parecem ser de um outro tipo, já que as "contra-revoluções" – por falta de um nome melhor – são também muitas e variadas.

Ainda que seja difícil apontar com precisão a origem, ou mesmo localizar quais exatamente seriam tais insurreições, vê-las pelos índices das ‘contra-insurreições’ é uma tarefa genealógica aparentemente interminável: as chamadas ‘primaveras árabes’ foram, uma a uma, desmoronando em regimes mais brutais que os destituídos (veja-se a Líbia ou o Egito); o Occupy Wall Street deu lugar a uma disputa presidencial entre, de um lado, um candidato a presidente sabidamente racista e homofóbico e, de outro, uma candidata que derrotou seu concorrente de partido de maneira comprovadamente desleal (Trump e Hillary, na eleição de 2016); simultaneamente, nos mesmos EUA, a violência racista xenofóbica e homofóbica alcançou patamares alarmantes (dos assassinatos de Trayvon Martin, Michael Brown e Freddie Gray aos ataques no clube Pulse em Orlando, passando por tantos outros); os espanhóis do 15M, alguns dos quais organizados em torno de uma agremiação política tradicional, o partido Podemos, perderam, numa segunda eleição legislativa, o pouco espaço que tinham ganho para o partido governista e conservador, o PP espanhol; no Brasil, anos depois do que aconteceu em Junho de 2013 e após um acirrado processo eleitoral (em 2014), instalou-se uma profunda instabilidade política associada a uma controversa operação de investigação de corrupção (Lava Jato) e iniciou-se um golpe de estado conservador na forma de um suposto impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff que contou com o apoio de manifestações de rua com expressiva participação; na Europa, desencadeou-se uma profunda crise econômica, somada a (e possivelmente impulsionada por) uma crise de imigração de escalas continentais, e chegou-se ao ponto em que a população do Reino Unido votou pela saída da União Européia (aparentemente, sem saber o que fez).i

Os tempos são tão sombrios que os exemplos poderiam continuar, país a país, caso a caso, e formar uma lista dos que podem ser os mais inacreditáveis acontecimentos dos últimos tempos. O que poderia ter dado errado?

O caso brasileiro é paradigmático não apenas pela proximidade, mas também pela maneira como se desenrola e os mecanismos que mobiliza (ou que podem ser mobilizados para entendê-lo). Seria cômico se não fosse de uma crueldade descomunal que um dos principais movimentos ditos populares que articularam o impeachment chama-se MBL (Movimento Brasil Livre), uma clara alusão/cooptação fonética da sigla MPL (Movimento Passe Livre) – um molde formal para as campanhas que ocorreram desde 2015 e levaram à destituição da presidenta em Maio de 2016.ii

Não deveria ser surpreendente que as forças conservadoras estejam sempre dispostas a dobrar e tornar suas (cooptar) todas as energias e “invenções” dos seus inimigos – não há modo mais eficaz de conservação. Mas quanto a isso, não deixa de ser instrutivo lembrar que os integrantes do MBL (e outros) tenham ido às ruas gritando “quem não pula é petista” ou “vem pra rua”, frases que, devidamente modificadas, tinham sido bradadas à exaustão em todo o país durante as manifestações convocadas pelo MPL ao longo de Junho 2013. (Além de “vem pra rua”, a frase originalmente utilizada pelo MPL era “quem não pula quer tarifa” em referência à demanda do fim da tarifa cobrada no transporte público). Ou ainda, lembrar que o próprio fato de terem ido às ruas em manifestações é uma contradição (ao menos aparente), dada a força conservadora que os movia: a manifestação de rua era entendida até então como uma ação violenta porque negava as estruturas de poder e ordem estabelecidas (e a eficácia da manifestação de rua como estratégia anti-sistêmica supostamente se nutriria justamente disso). Contradição atenuada, é verdade, pelo fato de a maioria das manifestações, ainda que de rua, ter acontecido em domingos e em vias onde o uso exclusivamente por pedestres neste dias já tinha algo de aceito – para não mencionar os “panelaços”, que ocorreram em esmagadora maioria nas sacadas dos condomínios dos bairros nobres do país. Mesmo assim, como é possível que até a forma manifestação de rua possa ter sido cooptada por um movimento conservador?iii

Mas, para poder ir além das anedotas, seria útil reconhecer no contexto brasileiro as especificidades que tornam seu caso sintomático. As especificidades são tantas que decidir por onde começar torna-se tarefa difícil: Um país cuja história ditatorial recente é única e cujos desdobramentos culturais, políticos e econômicos ainda são tabus? Um país cuja produção cultural em geral – e a propagandística em particular – é (apesar de tudo?) reconhecidamente excepcional? Um país com uma inacreditável configuração midiática (principalmente no que se refere às mídias tradicionais como jornais, revistas, televisão etc.)? Um país eminentemente “comunicativo”, com uma das maiores presenças na internet, em especial de usuários nas redes sociais?iv

Os seus escopos não permitem que nenhuma resposta a essas perguntas seja sequer esboçada aqui, bastaria reconhecer que tudo se passa como se as especificidades da condição brasileira criassem uma espécie de posição privilegiada para entender em termos mais gerais o caminho paradigmático que, por exemplo, leva do MPL ao MBL.

Para começar a compreender o contexto que permeia (e conecta) esses acontecimentos talvez ainda seja necessário dar dois passos atrás. Seremos de novo obrigados a nos confrontar com (e agora negar) o trabalho. Porque se por um lado, "[e]xceto por uma ínfima minoria de retardatários, ninguém mais acredita no trabalho [e] justamente por isso a fé em sua necessidade só se torna mais feroz", por outro, o trabalho é o mais claro indicador dos caminhos evolutivos do capitalismo, manifestado pela classe trabalhadora:

“A cada época, a forma de aparição do proletariado se redefine em função da configuração geral das hostilidades. A mais lamentável confusão em relação a isso diz respeito à “classe operária”. Como tal, a classe operária sempre foi hostil ao movimento revolucionário e ao comunismo. [...] Se tirarmos dele os elementos plebeus, o que significa precisamente aquilo que ele não podia reconhecer como operário, o movimento operário coincide ao longo de toda sua existência com a parte progressista do capitalismo”.2

Sobre as notas e sua numeração.

2 - Citações de TIQQUN, Isto não é um programa (São Paulo, Dazibao, 2012), p. 143 e 31, respectivamente. A partir daqui, numerações de página que aparecerem no corpo principal do texto referem-se a esta edição.

Mas qual exatamente é a classe operária que precisaria ser analisada por uma crítica que se pretenda contemporânea? Certamente não mais os trabalhadores manuais, trocados por máquinas a partir de fins do século XIX (por mais que sigam existindo hoje), possivelmente não mais os trabalhadores fabris do início do século XX (paulatinamente robotizados, mas que também ainda existem) e talvez nem mesmo os precários trabalhadores do setor terciário que ganharam importância a partir de meados do século XX (e que se multiplicam a cada dia apesar das supostas ameaças do avanço da chamada ‘inteligência artificial’). Não, o caminho hegemônico,3 por mais que talvez ainda minoritário quantitativamente, tem a ver com o

3 - “Falar de forma ‘hegemônica’ implica, nesse contexto, admitir que, mesmo não sendo aquela que numericamente cobre a maior parte dos casos, ela tem a força de determinar a tendência de desenvolvimento de todas as demais”, conforme Vladimir Safatle em Cinismo e falência da crítica (São Paulo, Boitempo, 2008), p. 12.

“fato de SE chamar hoje de trabalho aquilo que até ontem mesmo era qualificado como lazer – pessoas que ‘testam videogames’ são pagas para jogar o dia todo; ‘artistas’ recebem para fazer suas micagens em público; uma massa crescente de impotentes que SE intitulam de psicanalistas, cartomantes, coaches ou apenas psicólogos ganha somas consideráveis aos montes para escutar outras pessoas se lamentando [...]” (p. 143).

Torna-se claro que, bem ao modo cognitivo preferido do que Negri e Tiqqun chamam Império, ou do que os situacionistas chamam de Espetáculo, é preciso entender como trabalho justamente aquilo que não é entendido como trabalho. E do ponto de vista da economia quantitativa é relativamente fácil fazê-lo: se a internet é um dos principais lugares de valorização (no sentido genérico) na contemporaneidade basta buscar nela onde se concentram as intermináveis massas humanas que não trabalham: as redes sociais.v E depois é preciso ir além.

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Em 2012 ocorreu a oferta pública inicial das ações do Facebook na bolsa de valores de Nova Iorque, uma das maiores aberturas de capital de toda a história, totalizando aproximadamente a vultosa e inacreditável soma de 100 bilhões de dólares. A abertura de capital da Petrobrás, que somou aproximadamente a metade da do Facebook, também foi uma das maiores de todos os tempos.vi Mas, se o preço da Petrobrás foi dado pela promessa da extração de grandes quantidades do petróleo da camada pré-sal, de onde vem a valorização monetária tão mais expressiva do Facebook? Ou: o quê ou quem produz esse dinheiro?4 Os poucos programadores que fazem o site certamente não podem ser responsáveis por essa enorme soma. De volta à massa humana que não trabalha: no Facebook são os bilhões de usuários e o interminável conteúdo que eles colocam no site que dão razão à sua existência. É evidente: é o trabalho de colocar o conteúdo no Facebook que é transformado em dinheiro. O curioso é que em alguma medida, a valorização monetária explícita na bolsa de valores é constrangedora para o próprio Facebook porque é justamente essa valorização que deixa entrever quanto seus usuários não são simplesmente consumidores que produzem (ou produtores que consomem).

4 - Adendo de abril de 2019: as discussões relativas aos modos de funcionamento e modelos econômicos de redes sociais (e outros), bem como de seus efeitos colaterais, foi muito aprofundada e desenvolvida no (agora) incontornável livro de Shoshana Zuboff, The age of surveillance capitalism (Londres, Profile Books, 2019).

Quem faz esses sites pode alegar que oferece um serviço gratuito e, em troca, os usuários simplesmente se beneficiam dele. Mas os usuários ‘pagam’ não só por sua própria exposição à propaganda (que, aliás, é como a maioria dos sites funciona), mas também ao fornecer suas informações (na forma de, entre outros, seu comportamento no site) – esses dois ramos são complementares e retroalimentam-se, já que os perfis demográficos de alta fidelidade dos usuários do Facebook lhes permite direcionar a propaganda com precisão, e, não à toa, a empresa contabiliza as maiores taxas de crescimento de lucros com propaganda na internet, tendo chegado a triplicar em 2016.

Os usuários oferecem, em troca do serviço, sua atenção, sua cognição. E mais, para os usuários tudo se passa como se eles estivessem produzindo – a recompensa é também da ordem da diversão, do prazer: óbvio, diferente de ler uma revista e ter que se deparar com uma propaganda aqui e ali, os membros do Facebook são ativos, eles atualizam seus status, compartilham links, criam eventos, trocam fotos e vídeos, comentam e, acima de tudo, “curtem”.5

5 - A discussão, aqui, utiliza o Facebook como paradigma, mas é relativamente simples fazer analogias com outras redes sociais. Sobre o crescimento acelerado e único dos seus lucros, ver “”Facebook Profit Nearly Triples on Mobile Ad Sales and New Users http://www.nytimes.com/2016/07/28/technology/facebook-earnings-mobile-ad-revenue.html). A despeito da particularidade, seria necessário reavaliar o funcionamento da dinâmica de “curtidas” do Facebook à luz das novas formas de “curtir” introduzidas com as chamadas “reações”, no início de 2016 (ver, por exemplo, “Facebook reactions, the totally redesigned like button, is here” http://www.wired.com/2016/02/facebook-reactions-totally-redesigned-like-button/). Suspeito que haja aí o indício da substituição de uma sistemática quantitativa interna ao funcionamento do Facebook, que parece reconhecer uma transição (ou sobreposição) da cultura do ‘curtir’ para uma cultura de ‘compartilhamento’. É notável que no mesmo período o botão “compartilhar” passou a permear toda a interface do site, ou seja, agora é possível que mesmo um pequeno texto de ‘status’ possa se tornar ‘conteúdo’ viral (ao modo do Twitter e seus re-tweets). Ao mesmo tempo, as diversas ‘reações’ (no lugar do mero ‘curtir’) permitem uma avaliação mais matizada do engajamento dos usuários com o conteúdo (que ainda podem alavancar sua visibilidade compartilhando-o). Seja como for, esta análise exigiria outro texto.

Se o Facebook vale tanto, seus usuários também “valem” (de algum modo); ou melhor (ou pior, na verdade!), o trabalho realizado por eles também “vale”. Mas, por mais que haja uma espécie de “remuneração” psicológica de ordem libidinal – dos vários prazeres que podem ser extraídos do uso contínuo do site, desde uma suposta glória de ser reconhecido (de se tornar uma subcelebridade), passando tanto pelos pequenos afagos que satisfazem egos sedentos por receber atenção quanto pela satisfação de se entender no controle da construção de uma identidade (virtual) e até o voyeurismo explícito de ‘stalkear’ (perseguir ou investigar) perfis de terceiros –, os usuários não estão sendo remunerados. Eles não estão sendo pagos por esse trabalho, ou seja, ainda que o usuário do Facebook produza algo, essa produção não tem retorno financeiro para ele porque é como se esse retorno fosse a todo tempo imediatamente tomado pelo Facebook. Assim, a produção não se dá em termos, digamos, clássicos – como, por exemplo, quando um sapateiro fazia um sapato, vendia o sapato e ganhava por isso. Tudo se passa como se os usuários escolhessem ser explorados: parece a princípio uma troca “justa”, mas o grande beneficiário é o Facebook e o usuário acaba trabalhando de graça; não só ele oferece a cognição dele para ser explorada, mas pior, ele também oferece com prazer aquilo que é capaz de produzir; e ainda escolhe por vontade própria se sujeitar a isso, numa espécie de auto-proletarização. Se dar conta disso é perceber que o usuário deixa de ser mero usuário: o usuário é um produtor e não é; é um produtor, mas apenas como consumidor; é um consumidor que se passa por produtor, mas explorado; é apenas um consumidor, mas já duplamente alienado, porque é simultaneamente alienado da sua produção e do seu consumo – a figura acabada daquilo que se poderia chamar de "prosumidor" (uma contração das palavras 'produtor' e 'consumidor').

No início dos anos 2000, logo após o auge do entusiasmo com a “cultura ponto com”, falava-se muito em “ativismo de sofá”.vii Levados pelo fervor e novidade dos sítios web, vislumbrava-se a possibilidade de novas maneiras de organização e mobilização de grupos políticos ou com pautas e demandas sociais, culturais, econômicas etc. Parecia bastante claro: do mesmo modo que a CNN podia ter sua página na rede, um pequeno grupo de moradores de uma vila esquecida em algum lugar também poderia ter a sua. A diferença, claro, é que a CNN segue a dinâmica da massificação e é capaz de alimentar e produzir uma quantidade muito maior de conteúdo (ideologia) que qualquer grupo de vizinhos. Por mais que “cnn.com” e “grupodevizinhos.com” possam parecer estruturalmente iguais, restam ainda diferenças que remontam às mídias tradicionais. Diferenças que agora, de novo, parecem ser apagadas pelas redes sociais.

Vivemos cada vez mais numa cultura que gira ao redor de "curtir" e "compartilhar", onde as estruturas e modos de funcionamento das redes sociais tornaram-se incontornáveis para qualquer atividade (da organização política às trocas afetivas, das compras à educação e assim por diante). E onde essas atividades foram levadas para uma nebulosa esfera mercantilizada em que não só as embalagens de qualquer produto parecem ser obrigadas a estampar o logotipo das redes sociais como até as eleições presidenciais ou impeachments se tornam rentáveis negócios, verdadeiras hashtags. Se aceitarmos que as redes sociais representam um modo hegemônico de trabalho e que o trabalho é o elemento progressista do capitalismo, se torna inescapável que o(s) modo(s) de funcionamento das redes sociais também deve(m) ser de especial interesse ao poder, ou seja, o modo de funcionamento das redes sociais deve ser entendido como politicamente determinante. Por mais que seja fácil perceber que “curtir” e “compartilhar” são as atividades fundamentais (trabalho) dentro das redes sociais, é necessário reconhecer que os memes representam a forma prototípica que rege essas atividades, bem como é preciso entender seu funcionamento.

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Quando desenvolveu o conceito de meme no final da década de oitenta, Richard Dawkins jamais poderia imaginar que ‘posters motivacionais’ e ‘image macros’ – dois dos tipos mais comuns de memes de internet – seriam a primeira coisa que viriam à mente quando se falasse a palavra “meme” na segunda década do século vinte e um. O meme tem sua origem no campo da genética, mais especificamente numa relação com gene – em uma analogia com a disseminação de informação cultural. Para Dawkins, o meme, como o gene, é um “replicador”, sendo ambos “unidades fundamentais da seleção natural, as coisas básicas que sobrevivem ou fracassam, que formam linhagens de cópias idênticas com mutações ocasionais”.6 Dawkins afirma que a “transmissão cultural é análoga à transmissão genética”, por isso a necessidade de “um nome para o novo replicador, um substantivo que transmita a ideia de uma unidade de transmissão cultural, ou uma unidade de imitação”: o meme.7 De acordo com Dawkins:

7 - Idem, p. 192 – neste caso, a tradução segue a edição brasileira do livro.

6 - Richard Dawkins, The selfish gene: 30th Anniversary Edition (Oxford, Oxford University Press, 2006), p. 253 – tradução de Roberto Winter. Para a discussão abordada aqui, ver, em especial, o capítulo 11.

“Exemplos de memes são melodias, ideias, "slogans", modas do vestuário, maneiras de fazer potes ou de construir arcos. Da mesma forma como os genes se propagam no ‘conjunto’ [pool] de genes pulando de corpo para corpo através dos espermatozóides ou dos óvulos, os memes propagam-se no ‘fundo’ [pool]8 de memes pulando de cérebro para cérebro por meio de um processo que pode ser chamado, no sentido amplo, de imitação. Se um cientista ouve ou lê uma ideia boa ele a transmite a seus colegas e alunos. Ele a menciona em seus artigos e conferências. Se a ideia pegar, pode-se dizer que ela se propaga a si própria, espalhando-se de cérebro a cérebro. Como meu colega N. K. Humphrey claramente resumiu uma versão inicial deste capítulo: ‘... os memes devem ser considerados como estruturas vivas, não apenas metafórica mas tecnicamente. Quando você planta um meme fértil em minha mente, você literalmente parasita meu cérebro, transformando-o num veículo para a propagação do meme, exatamente como um vírus pode parasitar o mecanismo genético de uma célula hospedeira. E isto não é apenas uma maneira de falar – o meme, por exemplo, para ‘crença numa vida após a morte’ é, de fato, realizado fisicamente, milhões de vezes, como uma estrutura nos sistemas nervosos dos homens, individualmente, por todo o mundo’.”9

8 - A tradução brasileira de The selfish gene, O gene egoísta (São Paulo, Edusp, 1979), opta por usar “fundo” para a palavra “pool”, seguimos a mesma convenção aqui, apesar de não parecer a opção mais clara.

9 - Richard Dawkins, The selfish gene (op.cit.), p. 192 – tradução de R.W. seguindo a edição brasileira do livro.

Assim, um meme é simplesmente algo como uma informação, uma memória ou uma ideia que se espalha dentro de uma sociedade, replicando-se, sofrendo mutações e sujeita a um processo de seleção natural. (Não cabe aqui entrar no mérito do darwinismo cultural duvidoso que parece sustentar a proposta de Dawkins).viii

Essa definição, possivelmente mais ampla, deu lugar ao uso da palavra meme em referência ao que se poderia chamar mais especificamente de “meme de internet”, que são basicamente piadas visuais “virais” na internet que, de modo geral, fazem alusão a elementos da cultura popular (ou de massa) e seguem formas reconhecíveis (formas como os já citados ‘image macros’, por exemplo).10

10 - Uma caracterização aprofundada e com mais nuances sobre os memes no contexto da cultura digital, bem como sobre conceitos correlatos, é dada por Limor Shifman, Memes in digital culture (Cambridge, MIT University Press, 2014).

11 - Uma digressão possível, mas que será evitada aqui, envolveria considerar essa ideia de “forma” exclusivamente a partir do contexto da arte, ou seja, reconhecendo o problema como potencialmente estético/artístico. E nos dois sentidos: uma certa preferência do campo artístico por uma produção (dita) conceitual (ou, nos termos deste texto, uma produção artística memética) também poderia ser reavaliada. Caberia perguntar ainda: qual o papel da produção artística na criação das bases e na manutenção da atual condição memética? Uma pergunta não só retrospectiva – sobre como a arte lhe proveu bases, por exemplo, por meio das estratégias de apropriação –, mas também prospectiva, sobre como a arte se engaja na manutenção ou, alternativamente, sobre como poderia contribuir para a superação dessa condição.

O meme deve ser entendido como uma construção semântica, como um elemento formal dentro da linguagem das redes sociais.11 Isso significa que não se pode reconhecer apenas os “memes de internet” como memes, mas também a crescente capacidade das estruturas das redes em transformar tudo em “meme”: notícias de jornal reduzem-se às suas manchetes, longas entrevistas reduzem-se a curtos vídeos, pensamentos e teorias reduzem-se a frases de autoajuda e assim por diante. Reconhecer as chamadas hashtags como meme é dar-se conta disso. Qualquer coisa pode ser memeficada, basta que seja submetida a uma simplificação e dada a forma de uma representação visual cativante com uma alusão fraca a alguma ideia, conceito ou noção prévio que o alvo desejado do meme possa alegar (re)conhecer.

E na memeficação da política vê-se a realização formal inequívoca do papel atribuído pelo poder na sociedade capitalista contemporânea a todas as manifestações políticas – não só porque confere forma fechada e pré-concebida a manifestações espontâneas, mas também porque coloca qualquer manifestação que se valha dessa forma em um mesmo patamar de simplificação e numa dinâmica gerida de apreciação e produção de sentido. Se o slogan político já foi um modo de posicionamento potente exatamente porque seu uso estava indissociavelmente atrelado a intervenções reconhecidas como violentas (manifestações de rua, pixações, panfletagens etc.), o meme é elemento apaziguador ao introduzir o slogan (ou uma variação dele) num ambiente controlado e numa manifestação formal engessada e programática. O meme também reconfigura o próprio slogan político como meme; torna-o idêntico a si ao permitir ou tornar inescapável que seja reconhecido também como meme, ainda que para isso tenha que modificá-lo. Assim o MPL facilmente vira MBL, “quem não pula quer tarifa” vira “quem não pula é petista”, e assim por diante. Mais ainda, a própria forma-manifestação pode ser desgastada, cooptada; não só porque vira meme (torna-se imagem “viralizada”), mas também porque agora é possível dissociá-la do seu conteúdo supostamente intrínseco – conteúdo que, agora torna-se mais claro, talvez nunca tenha sido intrínseco à sua forma.

O meme apresenta-se então como a condensação de uma possibilidade de existência cínica, na qual sob uma mesma forma qualquer coisa pode ser trocada por qualquer outra sem que haja prejuízo para um certo estado anterior de coisas. Que se possa pedir que tudo mude para que tudo permaneça como era antes.

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Como era antes… por mais que diferente. A referência ao slogan político é um indício de que ainda existe aí alguma conexão com a propaganda, o marketing. E entender a diferença entre aquele momento da predominância das velhas formas de propaganda (em relação às atividades políticas) e a atual força do meme nos daria a dimensão da complexidade da situação. A primeira pergunta que se poderia fazer seria: por que o impulso memeficador é capaz de reconfigurar (retroativamente), por exemplo, o slogan político como meme e o mesmo não era verdade para a relação da propaganda com o slogan político? Em outras palavras: por mais que o slogan político possa se configurar como propaganda (por ser slogan), não era razoável dizer que a mera existência (ou aceitação) da (forma) propaganda permitiria a transformação (cooptação) de um slogan político qualquer na dinâmica da propaganda com a mesma totalidade que parece ser capaz de fazê-lo o meme. O ponto crucial reside, de volta às redes sociais, numa diferença estrutural.ix Se o reconhecimento de uma dimensão violenta da manifestação de rua era possível devido à sua ruptura com as estruturas de poder estabelecidas (o Estado, a ordem urbana, o controle dos corpos etc.), a propaganda (assim como o slogan propagandístico) também possuía lugares fixos e determinados de ocorrência: as páginas dos jornais e revistas, os outdoors, as telas de televisão. A propaganda não podia retomar para si sem perdas aquilo cuja forma original lhe era totalmente alheia. O meme extrapola essa determinação, ou melhor, manifesta-se principalmente numa outra estrutura: as redes sociais. Estas se apresentam como estruturas vazias, aparentemente não-pré-determinadas e cujo sentido é dado pelo(s) seu(s) uso(s) – e que necessitam absorver todo o conteúdo possível. Nas redes sociais dá-se uma espécie de amalgamento das dimensões privadas, públicas, pessoais, culturais, políticas e assim por diante. Amalgamento este que não era possível antesx e que configura um novo lugar de poder e de (aparente) exercício dele. O meme, entendido então como emergência específica da internet em geral e das redes sociais em específico (numa relação de simbiose) se potencializa como forma cooptável justamente na medida em que é manifestação típica de um lugar entendido como aquele que permite comunicações interpessoais vistas como diretas (porque a estrutura da rede social e seus condicionamentos faz-se invisível para os interlocutores). Por isso, muito além das capacidades da propaganda tradicional, os memes parecem permitir essa reconfiguração semântica retrospectiva de outros elementos, pois enquanto a propaganda estabelecia necessariamente uma relação determinada de poder (de submissão, necessariamente não interpessoal), a propagação e mutação dos memes na internet (e nas redes sociais) embaralham, nublam, apagam e alienam essas relações – e o fazem de modo estritamente técnico.

A separação de um indivíduo qualquer em relação ao conteúdo de um outdoor é muito maior do que a relação dela ou dele em relação a um vídeo no YouTube; afinal de contas, “qualquer” pessoa pode colocar ou ter colocado um vídeo no YouTube,12 enquanto que um usufruto do outdoor como meio de comunicação impõe pré-condições claras (em outras palavras: por ser, antes de tudo, muito caro, é inacessível de um modo geral). Pensado assim, torna-se mais claro o papel das redes sociais em relação à internet: por mais que seja verdade que qualquer pessoa pode ter uma página na internet – do mesmo modo que uma gigantesca empresa multimilionária – também é óbvio que a diferença de recursos disponíveis para cada uma produzirá páginas estruturalmente muito diferentes. O mesmo não é totalmente verdade em relação às redes sociais: o perfil da Coca-Cola no Instagram tem exatamente as mesmas possibilidades estruturais que o perfil de um adolescente etíope ou até o de uma organização terrorista como o ISIS – a grande diferença, como também era o caso das páginas da internet, é a qualidade do conteúdo que se disponibilizará em cada um dos perfis. Do mesmo modo que Andy Warhol enaltecia a Coca-Cola por ser democrática, por sempre ser igual para todos, as redes sociais se passam por uma espécie de tábula-rasa da experiência formal da informação; são a mídia anti-mídia meta-mídia. E, consequentemente, um meta-poder.13

12 - “Qualquer pessoa” é um exagero, já que o uso do YouTube requer um dispositivo que possa acessá-lo, uma conexão à internet, um conhecimento sobre seu funcionamento e assim por diante; fato é que a disponibilização de conteúdo é consideravelmente simples neste tipo de plataforma.

13 - A declaração original de Warhol costuma ser citada num contexto em que se exalta o aspecto democrático da cultura de consumo, ainda que nada tenha a ver com democracia: “O que é maravilhoso sobre este país é que a América iniciou a tradição onde os consumidores mais ricos compram essencialmente as mesmas coisas que os mais pobres. Você pode estar assistindo TV e vê a Coca-Cola, e você sabe que o presidente toma Coca-Cola, Liz Taylor toma Coca-Cola. Uma Coca é uma Coca e nenhum dinheiro pode conseguir uma Coca melhor do que a que aquele mendigo na esquina está tomando. Todas as Cocas são iguais e todas são boas. Liz Taylor sabe disso, o presidente sabe disso, o cara da esquina sabe disso e você sabe disso”.

A insistência no “meta” pretende apontar o fato de as redes sociais funcionarem como uma espécie de estrutura de mediação da mediação. Na realidade, talvez apenas as redes sociais mereçam realmente figurar na categoria de “mídia”, pois estão mediando o conteúdo produzido por canais de informação e os leitores. Uma das inúmeras polêmicas envolvendo a “curadoria” de notícias no Facebook (que, alega-se, censurava a aparição de conteúdo conservador entre os tópicos mais populares) revela que, como não poderia deixar de ser, sempre haverá elementos humanos e escolhas enviesadas em qualquer forma de mediação.xi A maior diferença no caso das redes sociais seria apenas que se parecem mais com (ou se passam mais por) uma ideia impossível de mídia que deseja ser tida como totalmente imparcial (inclusive porque são programadas – o que oculta sob a automatização o elemento humano, os programadores que decidem como serão feitas as escolhas automáticas).

As maneiras como as pessoas se relacionam com as redes sociais são muito particulares e diferentes, e é certo que a maior parte das pessoas nem sabe direito porque fazem o que fazem e/ou como fazem o que fazem — isso porque é impossível saber, já que ninguém tem acesso real a como elas funcionam (seja do ponto de vista técnico ou até mesmo conceitual/psíquico). O caso do Snapchat é exemplar, tendo-se em vista que não é incomum que seja mobilizada como justificativa para não usá-lo o fato de seu funcionamento ser incompreensível (em primeiro lugar, a maneira como a interface funciona; mas também, em maior medida, o fato de o porquê mesmo da sua existência, o seu para-que-serve, ser um mistério para muitos).xii De qualquer forma, o meta-poder das redes sociais está exatamente em se passar por invisível, em ser capaz de estruturar experiências e entendimentos ao mesmo tempo que, espantosamente, parece não ser percebida como estrutura.

Quando Chris Anderson propôs a sua teoria da cauda longa em 2004 foi recebido com algum otimismo, dada a possibilidade de ser possível vislumbrar ali um ponto final para a cultura de massas.14 A internet parecia oferecer os mecanismos técnicos que permitiriam que as pessoas pudessem acessar aqueles conteúdos que mais lhe interessassem, por mais que esse interesse fosse restrito a pequenos grupos. Grupos cujo valor econômico era praticamente nulo nas dinâmicas tradicionais do capitalismo porque não justificariam nem a disponibilização do conteúdo em primeiro lugar. Mas serviços como Amazon e Netflix poderiam se viabilizar e se valer justamente desses pequenos grupos para criar uma nova economia. Mas, uma vez que em 2004 as redes sociais apenas engatinhavam e o YouTube sequer existia – para ficar em apenas dois exemplos, já que a disponibilidade e utilização de serviços na internet modificou-se profundamente (ou completamente?) desde a segunda metade da década de 2000 –, Anderson não poderia imaginar que não apenas os interesses dos consumidores poderiam ser entendidos dessa nova maneira, como também se modificariam os papéis dos produtores de conteúdo e, mais ainda, toda a dinâmica se reconfiguraria com a emergência dos prosumidores. Os milhares de canais de subcelebridades no YouTube, cada um seguido por uns poucos milhões de usuários e com espantoso engajamento, realmente talvez deva ser entendido como um indício da superação da cultura de massas. Mas uma superação que se dá pela troca dela por uma meta-cultura de massas: o elemento de massa agora não é mais de conteúdo, mas é estrutural, ou seja, é o próprio YouTube – é necessário ressaltar que a cultura de massa segue existindo, até porque também serve como alicerce dessa nova organização (ou transição).

14 - A primeira versão apareceu num artigo da revista Wired em Outubro de 2004 e pode ser encontrada online em http://www.wired.com/2004/10/tail/

E para cada um dos vários ramos de atividade, uma meta-massificação: para a televisão, o YouTube (e o Netflix); para o transporte, o Uber; para a hotelaria, o AirBnB; para as compras, a Amazon (o eBay e o AliBaba); para a comunicação, o Whatsapp (e o Snapchat); para a mídia, o Twitter; para a cultura visual, o Instagram (e o Tumblr); e para todos, o Facebook.15 Estruturas de poder que, por construção, querem ser alienantes (invisíveis) e criar e reconfigurar, inclusive retroativamente, as experiências de mundo por meio de um entendimento memético dele.

15 - Conforme argumentado por Tom Goodwin, em “The Battle Is For The Customer Interface” (https://techcrunch.com/2015/03/03/in-the-age-of-disintermediation-the-battle-is-all-for-the-customer-interface/): “Em 2015, o Uber, a maior empresa de táxis do mundo, não possui veículos, o Facebook, o mais popular proprietário de mídia do mundo, não cria nenhum conteúdo, o Alibaba, o mais valioso revendedor não tem inventário e o Airbnb, o maior provedor de acomodações, não tem bens imóveis.” (um argumento que, em si mesmo, ‘viralizou’, conforme notou o próprio Goodwin em https://twitter.com/tomfgoodwin/status/579263447977865216).

Pouco a pouco é possível perceber que qualquer tentativa de subtrair-se desse contexto fracassaria antes mesmo de começar, a potência do meme está justamente em agir mesmo sobre aquilo que não lhe diz respeito (tudo é memetizável, cooptável). “Que ficássemos ausentes de suas provocações, indiferentes a seus valores, que deixássemos seus estímulos sem resposta, eis o pesadelo permanente da dominação cibernética”,16 pesadelo que parece ter sido superado pelo modo de funcionamento da forma meme. É possível dizer que já não há mais para onde retornar: o poder de ressignificação semântica dos memes é retroativo, é total e ilimitado. As antigas formas que possam ter parecido possíveis serão desgastadas e usadas dentro dessa nova dinâmica – e tornadas inócuas.

16 - TIQQUN, Isto não é um programa (op. cit.), p. 61. Alguns dos membros do TIQQUN responderiam anos depois à mesma questão do seguinte modo: “Devemos começar, no entanto, da hipótese que eles nos produzem. Criar-nos como sujeitos políticos, como ‘anarquistas’, como ‘Black Blocs’, como radicais ‘anti-sistema’, para nos extrair da população genérica e nos atribuir uma identidade política”. [The Invisible Committee, To our friends (Los Angeles, Semiotext(e), 2015), p. 163]. A tais diagnósticos deve-se somar que pessoas sem conta no Facebook podem ser dadas como irreais, como relatado em “If you aren't on Facebook, people won't believe you are real” (http://www.theverge.com/2016/7/21/12250046/meredith-mciver-fake-account-facebook-identity), ou a estarrecedora notícia segundo a qual pessoas que não possuam conta no Facebook podem passar a ser consideradas suspeitas de algum crime (numa lógica “você deve ter algo a esconder”), conforme “Facebook Abstainers Could Be Labeled Suspicious” (https://tech.slashdot.org/story/12/07/29/1627203/facebook-abstainers-could-be-labeled-suspicious).

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Mas como romper a dominação do meme, como se livrar dos seus grilhões totalitários? Curiosamente talvez já tenha sido possível entrever uma forma de fazê-lo lá nas “insurreições fracassadas”. Não por nenhum de seus sucessos, mas justamente por seus fracassos, pela maneira como foram positivadas. Basta lembrarmos que quase todas foram (e são) acompanhadas de extensas e controvertidas avaliações sobre a suas supostas violências. “Sem violência!”, por exemplo, foi um slogan comum nas manifestações de junho de 2013 no Brasil. Se referia em primeiro lugar à violência da polícia contra os manifestantes, mas, por extensão, também foi usada para aludir à suposta violência dos manifestantes contra o patrimônio material público ou privado (destruído ou vandalizado em muitas ocasiões das manifestações). O fato é que, diante de tal slogan, ambos, manifestantes e polícia (“violentos” ou não), apenas participavam de uma mesma dança memética cujo objetivo final era mantê-los em seus devidos lugares, desempenhando papéis previamente atribuídos a eles dentro da dinâmica de um espetáculo. Se a violência a que são submetidos os indivíduos é simbólica (memética), nada mais esperado que apenas saibam (ou queiram) revidá-la na mesma moeda; mas é justamente isso que se espera deles. Exatamente por isso as ações violentas fracassadas eram sempre reconhecíveis, isto é, usavam meros aparentes análogos das estratégias de espetáculo, e, consequentemente, eram facilmente memetizáveis. Porque se a violência memética da repressão produz resultados concretos, a violência memética contra ela só é capaz de produzir mais memes.

Assim, os Black Blocs não quebram bancos quando depredam suas fachadas; quebram nada mais do que uma espécie de imagem espectral do banco – ou melhor, produzem apenas frágeis representações dessa quebra, pois nem a imagem espectral dos bancos é realmente quebrada. O banco não é a fachada da agência, tampouco é a agência e nem o conjunto de todas as agências. Jogar pedras na imagem do rei nunca teria matado o rei: por mais que pudessem querer uma eficiência (ou até tenham feito isso), é evidente que os regicidas da Revolução Francesa poderiam ter destruído absolutamente todas as pinturas do rei da França e mesmo assim não teriam alcançado o objetivo de eliminar o rei. Uma possível reação analógica seria perguntar “mas quem é o rei agora?”. Essa é uma armadilha, porque o equivalente atual do equívoco que seria jogar pedras na imagem do rei é produzir violência contra coisas – pois, por mais que o poder na sociedade capitalista esteja materialmente estruturado, ele estrutura imaterialidades. Em outras palavras: hoje é como se o próprio rei fosse apenas imagem (por mais que ele queira a todo o momento se passar por material). O problema então deixa de ser o rei e torna-se a pedra.

Uma pedra que pudesse produzir a violência capaz de afrontar o vasto vazio do espetáculo, que atacasse inequivocamente seus modos de existência. E o fizesse não em forma e não simbolicamente, ou seja, que agisse sem se valer de algum dos modos próprios dos poderes estabelecidos, dos modos que já foram cooptados, que já estão dentro dele – ou seja, sem seguir confiando que a forma é indissociável do conteúdo (uma deformação ou mau entendimento da modernidade) e, ao mesmo tempo sem confiar numa potência simbólica de ações que só operam na esfera da representação (e não irrompem na realidade) ou, pior, não realizam coisa alguma. Certamente não a violência dos Black Blocs dos anos 80,17 não a violência da manifestação de rua, não a violência dos slogans políticos e nem mesmo a violência do chamado ‘terrorismo global’xiii — todas já devidamente reificadas, tornadas imagem, espetacularizadas e inseridas em formas de fruição apaziguadas e cooptáveis, memetizadas. Mas como redefinir a violência, uma redefinição que pudesse acabar com o monopólio das formas de violência efetivas? E justamente aí, na eficiência, um ponto crucial: a redefinição não poderia buscar apenas superar a violência esperada ao criar uma nova forma, mais um inesperado qualquer que aja simplesmente por meio da inovação, da lógica da novidade tão cara ao capitalismo, mas sim, antes de tudo, uma que fosse eficaz. Uma que fosse capaz de romper o domínio e a submissão estrutural (do meme), que não seja espetacularizável e que atinja justamente a dominação onde ela não se domina, o imperceptível na estrutura daquilo que se faz passar por não-estruturado para tornar-se imperceptível.

17 - Não deixa de haver uma diferença entre o que os Black Blocs são (ou como são retratados) hoje e como eram (retratados) na década de 80. Segundo o TIQQUN: “Ao passo que os Black Bloc nunca passaram de uma técnica de manifestação inventada pelos Autônomos alemães nos anos 80 que depois foi aperfeiçoada pelos anarquistas americanos no início dos anos 90 – e uma técnica significa algo de reapropriável, de contaminante –, já há algum tempo o Império não tem medido esforços para transformá-lo em sujeito, para fazer dele uma entidade fechada, compacta, estrangeira.” TIQQUN, Isto não é um programa, (op. cit.), p. 95.

Se voltarmos então às fachadas das agências dos bancos: para determinar como efetivamente quebrar um banco, nos termos em que as coisas estão postas, será que um funcionário do banco não está mais preparado para quebrar o banco do que aquele radical que pretende se abster da sociedade e desconhece por completo o funcionamento do banco? Em outras palavras: estrategicamente – e de modo paradoxal –, não é preciso estar no poder para destruí-lo? Configura-se um problema de separação: os radicais, anti-sistema, Black Blocs etc. não apenas cumprem justamente o papel atribuído a eles pelos poderes estabelecidos como também se destacam, literalmente se separam, o que impossibilita sua participação em ações meméticas projetadas que sejam realmente eficazes (eficazes dentro da dinâmica própria dos memes). Um bancário solitário qualquer, digamos, um analista de sistemas que todo dia bate o ponto biométrico vestindo camisa social com crachá pendurado no peito, que tem acesso a terminais com os sistemas internos do banco e pode arruinar todos os registros digitais que conformam a existência dessa instituição, se depara com chances muito mais concretas de quebrar um banco durante o expediente do que quaisquer milhões de Black Bloc mascarados cobertos das roupas pretas mais extravagantes marchando em seus coturnos com pedras nas mãos para atirar nas vidraças de um sem-número de agências. O bancário pode arruinar as únicas posses genuinamente valiosas do banco: posses que, não por acaso, sempre são dissimuladas como intangíveis e abstratas – no universo dos memes, o virtual é mais real do que o material. A saída então talvez deva ser tanto implosiva (de dentro) quanto violentamente memética (estratégica), porque, por mais que se queira, parece não haver mais como estar fora do poder para agir contra ele ou, de maneira simultaneamente óbvia e contraditória, é necessário reconhecer-se dentro para colocar-se fora, ou sair.

Notas

i - Seguem, abaixo, referências sobre os eventos destacados no texto:

Líbia: Sobre os desdobramentos das revoluções na Líbia, ver, entre outros, “Libya's Arab spring: the revolution that ate its children” (https://www.theguardian.com/world/2015/feb/16/libyas-arab-spring-the-revolution-that-ate-its-children).

Egito: Sobre a evolução dos levantes egípcios, ver “State repression in Egypt worst in decades, says activist” (https://www.theguardian.com/world/2016/jan/24/state-repression-egypt-worst-weve-ever-seen-activist-hossam-bahgat), ou ainda “Egypt's image crisis has grown worse” (http://www.aljazeera.com/indepth/opinion/2016/05/egypt-image-crisis-grown-worse-160505111925721.html) e “Repression in Egypt Worse than Mubarak” (http://www.economist.com/news/middle-east-and-africa/21650160-abdel-fattah-al-sisi-has-restored-order-egypt-great-cost-worse).

Trump: Sobre o candidato republicano Donald Trump, ver por exemplo “Donald Trump’s long history of racism, from the 1970s to 2016, explained” (http://www.vox.com/2016/7/25/12270880/donald-trump-racism-history) e “The top ten worst comments Donald Trump has made about LGBTQ people” (http://www.lgbtqnation.com/2016/02/the-top-ten-worst-comments-donald-trump-has-made-about-lgbtq-people/).

Hillary Clinton: Um conjunto de e-mails vazados no dia 23 de Julho mostra que a escolha de Clinton como candidata a presidência pelo partido Democrata (em detrimento do oponente Bernie Sanders) já havia sido decidida antes mesmo do início das primárias que deveria, ‘democraticamente’, escolhê-la; ver, por exemplo: “Leaked DNC Emails Confirm Democrats Rigged Primary, Reveal Extensive Media Collusion” (http://www.zerohedge.com/news/2016-07-23/leaked-dnc-emails-confirm-democrats-rigged-primary-reveal-extensive-media-collusion) e “New DNC email leak reveals anti-Sanders bias, pro-Clinton collusion among top officials” (https://www.rt.com/usa/352752-dnc-leaks-clinton-collusion/).

violência racista…: A organização “Black Lives Matter” (http://blacklivesmatter.com/) documenta e luta contra a violência imposta aos negros nos EUA. O ataque no Clube Pulse ocorreu no dia 12 de Junho de 2016 e custou a vida de 49 pessoas, conforme “2016 Orlando nightclub shooting” (https://en.wikipedia.org/wiki/2016_Orlando_nightclub_shooting).

PP espanhol: Um segunda eleição legislativa ocorrida em Junho de 2016, na Espanha, devido à impossibilidade de formação de governo após a primeira (ocorrida em Dezembro de 2015) surpreendeu até mesmo os conservadores. Ver, por exemplo, “El PP se refuerza y el bloque de la izquierda se debilita” (http://politica.elpais.com/politica/2016/06/26/actualidad/1466944221_203179.html) ou comparar os dados disponíveis em https://es.wikipedia.org/wiki/Elecciones_generales_de_Espa%C3%B1a_de_2015 e https://es.wikipedia.org/wiki/Elecciones_generales_de_Espa%C3%B1a_de_2016.

Junho de 2013: Ver “Protestos no Brasil em 2013” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Protestos_no_Brasil_em_2013).

manifestações de rua com expressiva participação: Ver “Protestos antigovernamentais no Brasil em 2015–2016” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Protestos_antigovernamentais_no_Brasil_em_2015%E2%80%932016).

crise de imigração: A gigantesca onda de refugiados, provocada em grande medida pelas guerras e governos repressivos em países como Síria, Eritréia, Somália, Afeganistão e Iraque, pode ser apontada como resultado das políticas externas desastrosas dos próprios países europeus (que fomentaram e ajudaram a criar golpes, revoltas e guerras). Para uma dimensão das proporções da crise, ver, por exemplo, “How the Migrant Crisis Has Changed Europe, in 1 Map” e referências citadas ali (http://www.citylab.com/housing/2016/06/how-migrants-have-reconfigured-europe-in-1-map/487190/).

saída da UE: Sugeriu-se que o aumento significativo das buscas no Google sobre o que aconteceria se o Reino Unido saísse da União Européia seria um indício do desconhecimento das consequências do voto: “Google search spike suggests people don't know why they Brexited” (http://www.theverge.com/2016/6/24/12022880/google-search-spike-brexit-why-leave-eu), ver também “After Brexit Vote, Britain Asks Google: 'What Is The EU?'” (http://www.npr.org/sections/alltechconsidered/2016/06/24/480949383/britains-google-searches-for-what-is-the-eu-spike-after-brexit-vote).

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ii - Entre tantos outros possíveis argumentos, o fato de ter vindo à tona a informação de que o MBL recebia dinheiro de entidades partidárias interessadas no impeachment demonstra sua corrupção, ver, por exemplo, “Movimento Brasil Livre (MBL), um engodo partidário” (http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Movimento-Brasil-Livre-MBL-um-engodo-partidario/4/36209). Mais ainda, o engajamento das mídias tradicionais de modo a direcionar a opinião pública a favorecer o impeachment é indicial da origem das forças retrógradas que movem o processo. Ver, para ficar em apenas um exemplo, “Folha comete fraude jornalística com pesquisa manipulada visando alavancar Temer” (https://theintercept.com/2016/07/20/folha-comete-fraude-jornalistica-com-pesquisa-manipulada-visando-alavancar-temer/). Caso o decalque que é o MBL em relação ao MPL não seja uma obviedade, ver, por exemplo, “A marcha sobre Brasília” (https://www.diplomatique.org.br/print.php?tipo=ar&id=2065) e, principalmente, “Financiamento, remuneração e imagem: a estrutura dos grupos anti-Dilma” (http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/03/150313_financiamento_protestos_rs).

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iii - Para exemplos dos gritos, ver, entre outros vídeos da época, “Quem não pula quer tarifa!!!” (https://www.youtube.com/watch?v=wAR5E-ugeY0) e “Moradores fazem panelaço e buzinaço contra pronunciamento de Dilma” (http://oglobo.globo.com/brasil/moradores-fazem-panelaco-buzinaco-contra-pronunciamento-de-dilma-15539538). Adendo de abril de 2019: em relação ao questionamento acerca da cooptação de práticas anti-sistêmicas pelos movimentos conservadores, vale a pena destacar que ele, em grande medida, assentava-se sobre uma percepção muito limitada e impressionista – mas que ainda constitui um consenso no campo da esquerda – acerca da emergência dos atores da nova direita no Brasil, circunscrita aos eventos imediatamente ligados à pulverização das pautas originais do Junho de 2013. Retrospectivamente, os dados e documentações apresentados por Camila Rocha, em ‘Menos Marx, mais Mises’ – Uma gênese da nova direita brasileira (2006-2018), tese de doutorado, orient. Prof. Dr. Adrian Lavalle (São Paulo, PPG-Ciência Política/FFLCH/USP, 2018), possibilitam uma percepção mais aguda e historicamente embasada do processo de formação da nova direita brasileira, que, no argumento da autora, remonta à adoção de práticas discursivas anti-sistêmicas por parte da direita ultraliberal a partir do mensalão, em 2006.

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iv - Um bom ponto de partida para a discussão acerca da ditadura empresarial-militar brasileira é o livro organizado por Edson Teles e Vladimir Safatle, O que resta da ditadura (São Paulo, Boitempo, 2010). Sobre o passado recente e ditatorial do Brasil e suas singularidades culturais frente os modos de vida contemporâneos, ver “Geopolítica da cafetinagem”, de Suely Rolnik (http://eipcp.net/transversal/1106/rolnik/pt), em especial a seção “Zumbis antropofágicos”. Em relação à especificidade da mídia brasileira, ver, entre tantos outros exemplos, “Mídia, política e crise no Brasil” (http://observatoriodaimprensa.com.br/armazem-literario/midia-politica-e-crise-no-brasil/), especialmente à luz do debate sobre a ‘regulação da mídia’ (http://www.ebc.com.br/regulacaodamidia). Para a presença massiva de brasileiros nas mídias sociais, ver, por exemplo, (https://www.sprinklr.com/the-way/social-media-statistics-brazil/) ou, em português “Brasileiros lideram ranking de horas gastas em redes sociais, diz estudo” (http://www.techtudo.com.br/noticias/noticia/2014/07/brasileiros-lideram-ranking-de-horas-gastas-em-redes-sociais-diz-estudo.html).

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v - Já em 2011 uma pesquisa da McKinsey apontava a internet como o sexto maior setor que contribuiria para os PIBs de nações do G-8 somadas ao Brasil, China, Índia, Coréia do Sul e Suécia; setor que seria maior que o setor energético ou a agricultura. Ver “Internet matters: The Net's sweeping impact on growth, jobs, and prosperity” (http://www.mckinsey.com/industries/high-tech/our-insights/internet-matters) e os PDFs dos relatórios completos referenciados ali.

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vi - Para a abertura de capital do Facebook, ver, por exemplo, “Facebook Prices Third-Largest IPO Ever, Valued At $104 Billion” (http://www.forbes.com/sites/tomiogeron/2012/05/17/facebook-prices-ipo-at-38-per-share/). Para o caso da Petrobrás, ver “Oferta da Petrobras soma R$ 120 bilhões, a maior da história” (http://economia.ig.com.br/mercados/oferta-da-petrobras-soma-r-120-bilhoes-a-maior-da-historia/n1237783246204.html).

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vii - Do inglês, “couch activism”. Em 2010 Malcom Gladwell fez uma apreciação relevante sobre o ‘ativismo de sofá’, disponível em “Small Change” (http://www.newyorker.com/magazine/2010/10/04/small-change-malcolm-gladwell).

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viii - O próprio Dawkins tenta defender o meme como replicador a partir desta perspectiva da seleção natural:

“É por imitação, em um sentido amplo, que os memes podem replicar-se. Mas, da mesma maneira como nem todos os genes que podem se replicar têm sucesso em fazê-lo, da mesma forma alguns memes são mais bem sucedidos no “fundo” [pool] do que outros. Isto é análogo à seleção natural. Mencionei exemplos específicos de qualidades que determinam um alto valor de sobrevivência entre os memes. Mas, de um modo geral, elas têm que ser as iguais àquelas discutidas para os replicadores do Capítulo 2: longevidade, fecundidade e fidelidade de cópia. A longevidade de uma cópia qualquer de um meme é, talvez, relativamente pouco importante, assim como o é uma cópia qualquer de um gene. A cópia da melodia “Auld Lang Syne” que existe em meu cérebro durará apenas até o fim de minha vida. A cópia da mesma melodia impressa em volume do Livro de Canções do Estudante Escocês provavelmente não durará muito mais que isto. Mas espero que existirão cópias da mesma melodia impressas e nos cérebros das pessoas por muitos séculos. Como no caso dos genes, a fecundidade é muito mais importante do que a longevidade de cópias específicas. Se o meme for uma ideia científica, sua difusão dependerá de quão aceitável ela é para a população de cientistas; uma primeira estimativa de seu valor de sobrevivência poderia ser obtida contando o número de vezes que ela é citada em revistas científicas em anos subsequentes. Se for uma melodia popular, sua difusão pelo "fundo" [pool] de memes poderá ser avaliada pelo número de pessoas que a assobiam nas ruas. Se for uma moda de sapato feminino, o memeticista de população poderá usar estatísticas de vendas de lojas de sapatos. Alguns memes, como alguns genes, conseguem um sucesso brilhante a curto prazo ao espalharem-se rapidamente, mas não permanecem muito tempo no “fundo” [pool]. As canções populares e os saltos finos são exemplos destes. Outros, tais como as leis religiosas judaicas, poderão continuar a se propagar durante milhares de anos, geralmente devido à grande durabilidade em potencial dos registros escritos. Isto me leva à terceira qualidade geral dos replicadores bem sucedidos: a fidelidade de cópia. Aqui devo admitir que estou inseguro. À primeira vista parece que os memes não são, de forma alguma, replicadores de alta fidelidade.”

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ix - Agradeço a Pedro França pela discussão que levou ao esclarecimento deste ponto.

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x - A pesquisadora de mídias sociais danah boyd chama o Facebook de "anomalia social", pois unifica a representação dos indivíduos num mesmo espaço social – ela argumenta que em nenhum momento da história um sujeito qualquer teve um "perfil social" único perante todos os grupos com os quais se relaciona. Ver “The era of Facebook is an anomaly” (www.theverge.com/2014/3/13/5488558/danah-boyd-interview-the-era-of-facebook-is-an-anomaly). O que também explica a estratégia econômica de “diversificação” do Facebook (a compra do Instagram e Whatsapp e a tentativa de compra do Snapchat).

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xi - Ver, por exemplo, “Former Facebook Workers: We Routinely Suppressed Conservative News” http://gizmodo.com/former-facebook-workers-we-routinely-suppressed-conser-1775461006, e comparar com “How Facebook decides what’s trending” http://www.recode.net/2015/8/21/11617880/how-facebook-decides-whats-trending).

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xii - Um ótimo exemplo da famigerada incompreensibilidade do Snapchat é a chamada ‘pontuação’ de cada usuário: os pontos são atribuídos de maneira inescrutável, o que parece ser proposital (conforme, por exemplo, “Snapchat Score Explained (2016 Update)” http://www.snapptips.com/snapchat-score-2015/); outro exemplo seriam as constantes (e profundas) mudanças na interface do aplicativo do Snapchat. Em relação ao “para-que-serve”, uma longa e informativa explicação para os possíveis usos do Snapchat pode ser encontrada em “My Little Sister Taught Me How To ‘Snapchat Like The Teens’” (https://www.buzzfeed.com/benrosen/how-to-snapchat-like-the-teens). Para entender o sucesso do Snapchat talvez ainda seja necessário comparar com “Teenagers migrate from Facebook as parents send them friend requests” (https://www.theguardian.com/technology/2013/dec/27/facebook-dead-and-buried-to-teens-research-finds).

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xiii - Basta ver a maneira como foram espetacularizados – e até cooptados – os atentados ocorridos na França em 2016; entre outras coisas, é espantoso que tenham tido entre seus efeitos o aumento da popularidade do presidente François Hollande (ver por exemplo “Unpopular Hollande gets modest poll boost after Paris attacks”, https://www.theguardian.com/world/2015/nov/22/unpopular-francois-hollande-modest-poll-boost-paris-attacks). Uma lição que talvez tenha sido aprendida com Margaret Thatcher durante a Guerra das Malvinas.

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