Projeto Portfólio: segundo encontro

Quando chegamos no Paço das Artes para assistir a segunda edição do Projeto Portfólio, parte do programa do educativo para a Temporada de Projetos, Laerte Ramos já falava ao público (desta vez mais heterogêneo, formado por adolescentes e adultos) sobre a sua trajetória por meio de uma projeção de imagens de trabalhos já realizados. Ao longo da sua apresentação, Laerte foi literalmente bombardeado de perguntas! Aqui vão algumas anotações nossas sobre essa conversa (desculpem, nem as perguntas nem as respostas estão completas, mas foi mais ou menos assim…!):
Laerte Ramos no Portfólio

Laerte Ramos fala com público no Projeto Portfólio

Pergunta: O que é arte contemporânea? Laerte: É a arte feita hoje. Arte é pesquisa, não é certeza. Eu tenho sempre que ter dúvidas para continuar pesquisando. Pergunta: O que é arte para você? Laerte: É expressão. é acordar, tomar banho, tomar chá japonês. Pode ser um caminho. depende de todo mundo. P: Você sentiu desejo de fazer arte desde pequeno? L: Desde a escola, onde eu aprendi a fazer coisas com a mão: cadeiras, mesas, coisas com lã, fio, tapete. P: Você vende as obras? L: Não tenho salário. Trabalho de segunda a segunda. Tento vender, mas é difícil. Tento ganhar a vida a partir de projetos. Por isso tento melhorar a apresentação do portfólio, saber escrever bem, tirar foto, como apresentar o trabalho. P: Você teve algum incentivo na família? Alguém que era artista? L: Não, não tive nenhum incentivo… P: Arte é artesanato, na minha referência. Arte é cultura, música, teatro, expressão. A arte como se pretende é elistista, e eu venho da periferia… L: Estamos mais acostumados com a música. Esse outro tipo de arte requer mais conhecimento; requer outro lugar. A cerâmica, por exemplo, eu não posso deixar na rua, mas as vezes a arte pode ir à rua e funcionar também. Posso dizer que para mim, as referências vem da rua, de amigos, exposições, filmes, cinema… tudo vira referência. Não adianta ficar só no atelier ou só vendendo. Eu venho aqui também para aprender com vocês, fazer trocas. P: Você tem alguma inspiração para fazer os trabalhos? L: Não diria inspiração. Mas artistas da minha geração e amigos são referências. P: Você dá título aos trabalhos? L: Às vezes o título vem antes do trabalho. Acho importante ter nome, saber qual série é, o que ele é, para não ser “sem título”… P: E qual foi a sua inspiracão para fazer esse trabalho [pergunta referente ao trabalho "re.van.che", apresnetado na Temporada de Projetos]? L: No meu atelier eu tenho um saco de luta. Vivo agora na liberdade [no bairro], e vejo bastante os elementos da rua. Também tem a fragilidade da cerâmica…. Gostaria que esse trabalho fosse como uma revanche contra a cerâmica, tipo tapa na cara da cerâmica! P: E porque não foi você que chutou o saco? [pergunta referente à performance do trabalho "re.van.che"] L: Ah! Porque uma mina é mais bonita! [risos]. E se tivesse sido eu ficaria meio engraçado… P: Quanto tempo você demorou para fazer esse trabalho? L: Cerca de um mês. P: O que você sentiu quando o saco quebrou? [durante a performance de "re.van.che"] L: Tristeza e felicidade. Tapa na cara mesmo! Eu pensei o trabalho no espaço físico aqui do Paço das Artes, o quadradinho. Sempre tenho reservas para o caso de um trabalho quebrar (durante transporte, montagem, etc). Faço peças-reservas. P: Qual foi o projeto mais difícil que você já fez? L: Não tem… desta série aqui foi gerenciar a performance, que era algo que não dependia de mim. P: Era qualquer peça que poderia ter quebrado? Ela [a lutadora da performance de re.van.che] escolheu o que quebrar? L: Não, era só o saco mesmo. Se bem que ela queria quebrar a bola também! L: Esse foi um projeto que estou há 10 anos tentando desenvolver, tentando participar da Temporada de Projetos do Paço. Aprendo mais com isso do que acertando: tentei vídeo, xilo, e surpreendentemente entrei com cerâmica, e acho que assim supererei o preconceito com o material. P: Em que escola você estudou? L: Rudolf Steiner. P: O que você acha da imposição de que não se pode tocar numa obra de arte? L: A política “não toque” não é interessante. Adoraria que todos pudessem tocar. Se bem que às vezes as pessoas abusam. Mas quebrar é interessante: veja o que acontece!

“A gente é sempre ‘hóspede’ dentro da instituição: nem sempre é bem visto”

Na vez das três integrantes do grupo Hóspede falarem, muitos dos grupos de estudantes presentes tiveram que ir embora, assim a apresentação delas foi para um público bem menor que a do Laerte. O Hóspéde tem um trabalho bastante interessante e provocativo, e por isso a apresentação (também por projeção de imagens de trabalhos realizados) poderia ter sido um pouco mais lenta e detalhada para uma melhor discussão dos trabalhos, o que não foi possível pois a seção do Portfólio se alongou um pouco.

Érica Ferrari, Carolina Caliento e Flora Rebollo falam sobre os trabalhos anteriores do Hóspede

Érica Ferrari, Carolina Caliento e Flora Rebollo falam sobre os trabalhos anteriores do Hóspede

As integrantes começaram falando da origem do grupo, que aconteceu em 2005 em uma disciplina de Escultura da prof. Ana Maria Tavares, na ECA-USP, e na qual Jorge Menna Barreto era professor assistente. A proposta feita para a disciplina era que os alunos realizassem trabalhos pensando nas especificidades do Departamento de Artes Plásticas. A disciplina também gerou o intercâmbio “Brasília hospeda São Paulo”, no qual alguns alunos da ECA fizeram uma expedição para Brasília para realizar um trabalho na Galeria de Bolso da Casa de Cultura da América Latina. Naquela época o Hóspede tinha 7 integrantes, depois, já de volta a SP, foram só 6 por muito tempo (até hoje, serem somente 3). As atuais integrantes afirmaram que usam desde o início a estratégia de fazer projetos para enviar para editais e assim conseguirem pró-labore para realizarem os trabalhos. Para o “Edital de Ocupação dos Espaços da Caixa Cultural“, em 2006, o Hóspede enviou um projeto para realizar uma ‘Casa de Penhores’, mas, apesar de selecionado, o projeto não foi realizado por problemas na instituição, que atrasou o projeto diversas vezes até que ele foi cancelado! Também em 2006, o Hóspede foi selecionado no Salão de Exposições de Santo André, São Paulo, onde construiram um grande banco no saguão do Paço Municipal para que as pessoas que ficavam esperando para entrar no teatro tivessem acomodação. Já para o  Prêmio Flamboyant (hoje extinto), do  Salão Nacional de Artes de Goiás, o grupo criou também um lugar de acomodação, só que dentro da sala de exposição, que ficava no Flamboyant Shopping Center e onde estavam expostos outros trabalhos selecionados, o móvel criado pelo grupo ironizava a estética de assentos dos shoppings centers. Em 2007, o Hóspede foi contemplado com um grande incentivo vindo do “Concurso de Apoio a Produção nas Áreas de artes Visuais, Fotografia e Novas Mídias” do Programa de Ação Cultural da Secretaria do Estado de São Paulo. O grupo realizou o projeto “Laboratório Hotel” — formação de centro de estudo e residência no Largo da Batata, região que estava prests a iniciar um processo de reconversão urbana. Segundo uma das integrantes “É difícil dizer o que foi…”. Mas, em linhas bem gerais, pretendia criar um centro sócio-cultural temporário que ficasse em contato com a condição urbana do entorno. A preocupação com a arquitetura urbana é parte dos projetos criados pelo Hóspede, que se diz interessado em questionar e ironizar essa “nova arquitetura que é fruto da especulação imobiliária de empresas; uma arquitetura monumental que vai representar um empreendimento; uma  arquitetura pós-moderna, que é mais imagem que arquitetura, é como pintura, uma escultura que você transita (…)  É um elefante branco, um abacaxi, que aparece sem estudar a área e conhecer o entorno. Os projetos de arquitetura caem do nada sem saber o que acontece ali”, conforme afirmou uma das integrantes na apresentação. Ao final da apresentação algumas perguntas foram feitas ao grupo em relação ao trabalho apresentado no Paço das Artes, um extenso tapume que cobre toda a entrada do edifício do Paço das Artes bem como uma série de ações que indicam que aquele lugar passará por um processo de reconversão, se tornando um “Pineapple Luxury Complex “. A maioria das pessoas disseram não ter percebido que aquilo se tratava de um trabalho de arte até aquele momento. O grupo respondeu afirmando que o trabalho pode e funciona com diversos públicos: existem pessoas que passam de carro pelo Paço e não percebem como arte. Isso, nas palavras do grupo, seria uma atitude perversa, de criar uma situação que parece real. “A arte não precisa ser didática”, afirmaram, “queremos pensar um trabalho para o lugar, pensar sobre o espaço, se as pessoas entendem se é obra de arte ou não é problema delas!”. As integrantes do grupo argumentaram também que na Universidade aprenderam a questionar as coisas ao redor, e não somente fazer ‘objetos estéticos’. “Trocar com as pessoas” e conversar sobre o que as atinge são coisas que o Hóspede disse estar buscando. O artista Cristiano Lenhardt, por não residir em São Paulo, não pôde comparecer ao evento.

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