Arquivo do mês de maio de 2009

Projeto Portfólio: segundo encontro

Quando chegamos no Paço das Artes para assistir a segunda edição do Projeto Portfólio, parte do programa do educativo para a Temporada de Projetos, Laerte Ramos já falava ao público (desta vez mais heterogêneo, formado por adolescentes e adultos) sobre a sua trajetória por meio de uma projeção de imagens de trabalhos já realizados. Ao longo da sua apresentação, Laerte foi literalmente bombardeado de perguntas! Aqui vão algumas anotações nossas sobre essa conversa (desculpem, nem as perguntas nem as respostas estão completas, mas foi mais ou menos assim…!):
Laerte Ramos no Portfólio

Laerte Ramos fala com público no Projeto Portfólio

Pergunta: O que é arte contemporânea? Laerte: É a arte feita hoje. Arte é pesquisa, não é certeza. Eu tenho sempre que ter dúvidas para continuar pesquisando. Pergunta: O que é arte para você? Laerte: É expressão. é acordar, tomar banho, tomar chá japonês. Pode ser um caminho. depende de todo mundo. P: Você sentiu desejo de fazer arte desde pequeno? L: Desde a escola, onde eu aprendi a fazer coisas com a mão: cadeiras, mesas, coisas com lã, fio, tapete. P: Você vende as obras? L: Não tenho salário. Trabalho de segunda a segunda. Tento vender, mas é difícil. Tento ganhar a vida a partir de projetos. Por isso tento melhorar a apresentação do portfólio, saber escrever bem, tirar foto, como apresentar o trabalho. P: Você teve algum incentivo na família? Alguém que era artista? L: Não, não tive nenhum incentivo… P: Arte é artesanato, na minha referência. Arte é cultura, música, teatro, expressão. A arte como se pretende é elistista, e eu venho da periferia… L: Estamos mais acostumados com a música. Esse outro tipo de arte requer mais conhecimento; requer outro lugar. A cerâmica, por exemplo, eu não posso deixar na rua, mas as vezes a arte pode ir à rua e funcionar também. Posso dizer que para mim, as referências vem da rua, de amigos, exposições, filmes, cinema… tudo vira referência. Não adianta ficar só no atelier ou só vendendo. Eu venho aqui também para aprender com vocês, fazer trocas. P: Você tem alguma inspiração para fazer os trabalhos? L: Não diria inspiração. Mas artistas da minha geração e amigos são referências. P: Você dá título aos trabalhos? L: Às vezes o título vem antes do trabalho. Acho importante ter nome, saber qual série é, o que ele é, para não ser “sem título”… P: E qual foi a sua inspiracão para fazer esse trabalho [pergunta referente ao trabalho "re.van.che", apresnetado na Temporada de Projetos]? L: No meu atelier eu tenho um saco de luta. Vivo agora na liberdade [no bairro], e vejo bastante os elementos da rua. Também tem a fragilidade da cerâmica…. Gostaria que esse trabalho fosse como uma revanche contra a cerâmica, tipo tapa na cara da cerâmica! P: E porque não foi você que chutou o saco? [pergunta referente à performance do trabalho "re.van.che"] L: Ah! Porque uma mina é mais bonita! [risos]. E se tivesse sido eu ficaria meio engraçado… P: Quanto tempo você demorou para fazer esse trabalho? L: Cerca de um mês. P: O que você sentiu quando o saco quebrou? [durante a performance de "re.van.che"] L: Tristeza e felicidade. Tapa na cara mesmo! Eu pensei o trabalho no espaço físico aqui do Paço das Artes, o quadradinho. Sempre tenho reservas para o caso de um trabalho quebrar (durante transporte, montagem, etc). Faço peças-reservas. P: Qual foi o projeto mais difícil que você já fez? L: Não tem… desta série aqui foi gerenciar a performance, que era algo que não dependia de mim. P: Era qualquer peça que poderia ter quebrado? Ela [a lutadora da performance de re.van.che] escolheu o que quebrar? L: Não, era só o saco mesmo. Se bem que ela queria quebrar a bola também! L: Esse foi um projeto que estou há 10 anos tentando desenvolver, tentando participar da Temporada de Projetos do Paço. Aprendo mais com isso do que acertando: tentei vídeo, xilo, e surpreendentemente entrei com cerâmica, e acho que assim supererei o preconceito com o material. P: Em que escola você estudou? L: Rudolf Steiner. P: O que você acha da imposição de que não se pode tocar numa obra de arte? L: A política “não toque” não é interessante. Adoraria que todos pudessem tocar. Se bem que às vezes as pessoas abusam. Mas quebrar é interessante: veja o que acontece!

“A gente é sempre ‘hóspede’ dentro da instituição: nem sempre é bem visto”

Na vez das três integrantes do grupo Hóspede falarem, muitos dos grupos de estudantes presentes tiveram que ir embora, assim a apresentação delas foi para um público bem menor que a do Laerte. O Hóspéde tem um trabalho bastante interessante e provocativo, e por isso a apresentação (também por projeção de imagens de trabalhos realizados) poderia ter sido um pouco mais lenta e detalhada para uma melhor discussão dos trabalhos, o que não foi possível pois a seção do Portfólio se alongou um pouco.

Érica Ferrari, Carolina Caliento e Flora Rebollo falam sobre os trabalhos anteriores do Hóspede

Érica Ferrari, Carolina Caliento e Flora Rebollo falam sobre os trabalhos anteriores do Hóspede

As integrantes começaram falando da origem do grupo, que aconteceu em 2005 em uma disciplina de Escultura da prof. Ana Maria Tavares, na ECA-USP, e na qual Jorge Menna Barreto era professor assistente. A proposta feita para a disciplina era que os alunos realizassem trabalhos pensando nas especificidades do Departamento de Artes Plásticas. A disciplina também gerou o intercâmbio “Brasília hospeda São Paulo”, no qual alguns alunos da ECA fizeram uma expedição para Brasília para realizar um trabalho na Galeria de Bolso da Casa de Cultura da América Latina. Naquela época o Hóspede tinha 7 integrantes, depois, já de volta a SP, foram só 6 por muito tempo (até hoje, serem somente 3). As atuais integrantes afirmaram que usam desde o início a estratégia de fazer projetos para enviar para editais e assim conseguirem pró-labore para realizarem os trabalhos. Para o “Edital de Ocupação dos Espaços da Caixa Cultural“, em 2006, o Hóspede enviou um projeto para realizar uma ‘Casa de Penhores’, mas, apesar de selecionado, o projeto não foi realizado por problemas na instituição, que atrasou o projeto diversas vezes até que ele foi cancelado! Também em 2006, o Hóspede foi selecionado no Salão de Exposições de Santo André, São Paulo, onde construiram um grande banco no saguão do Paço Municipal para que as pessoas que ficavam esperando para entrar no teatro tivessem acomodação. Já para o  Prêmio Flamboyant (hoje extinto), do  Salão Nacional de Artes de Goiás, o grupo criou também um lugar de acomodação, só que dentro da sala de exposição, que ficava no Flamboyant Shopping Center e onde estavam expostos outros trabalhos selecionados, o móvel criado pelo grupo ironizava a estética de assentos dos shoppings centers. Em 2007, o Hóspede foi contemplado com um grande incentivo vindo do “Concurso de Apoio a Produção nas Áreas de artes Visuais, Fotografia e Novas Mídias” do Programa de Ação Cultural da Secretaria do Estado de São Paulo. O grupo realizou o projeto “Laboratório Hotel” — formação de centro de estudo e residência no Largo da Batata, região que estava prests a iniciar um processo de reconversão urbana. Segundo uma das integrantes “É difícil dizer o que foi…”. Mas, em linhas bem gerais, pretendia criar um centro sócio-cultural temporário que ficasse em contato com a condição urbana do entorno. A preocupação com a arquitetura urbana é parte dos projetos criados pelo Hóspede, que se diz interessado em questionar e ironizar essa “nova arquitetura que é fruto da especulação imobiliária de empresas; uma arquitetura monumental que vai representar um empreendimento; uma  arquitetura pós-moderna, que é mais imagem que arquitetura, é como pintura, uma escultura que você transita (…)  É um elefante branco, um abacaxi, que aparece sem estudar a área e conhecer o entorno. Os projetos de arquitetura caem do nada sem saber o que acontece ali”, conforme afirmou uma das integrantes na apresentação. Ao final da apresentação algumas perguntas foram feitas ao grupo em relação ao trabalho apresentado no Paço das Artes, um extenso tapume que cobre toda a entrada do edifício do Paço das Artes bem como uma série de ações que indicam que aquele lugar passará por um processo de reconversão, se tornando um “Pineapple Luxury Complex “. A maioria das pessoas disseram não ter percebido que aquilo se tratava de um trabalho de arte até aquele momento. O grupo respondeu afirmando que o trabalho pode e funciona com diversos públicos: existem pessoas que passam de carro pelo Paço e não percebem como arte. Isso, nas palavras do grupo, seria uma atitude perversa, de criar uma situação que parece real. “A arte não precisa ser didática”, afirmaram, “queremos pensar um trabalho para o lugar, pensar sobre o espaço, se as pessoas entendem se é obra de arte ou não é problema delas!”. As integrantes do grupo argumentaram também que na Universidade aprenderam a questionar as coisas ao redor, e não somente fazer ‘objetos estéticos’. “Trocar com as pessoas” e conversar sobre o que as atinge são coisas que o Hóspede disse estar buscando. O artista Cristiano Lenhardt, por não residir em São Paulo, não pôde comparecer ao evento.

Expedição com Álvaro Razuk

Tivemos um encontro com a equipe do Paço das Artes, incluindo um novo produtor, o Maikon Rangel, e o Álvaro Razuk, arquiteto de exposições, para conversar mais uma vez sobre a expografia. Como o nosso orçamento é limitado, fizemos uma “expedição” pelos depósitos do Paço das Artes para verificar se existem materiais que podemos re-utilizar. No meio de inúmeros objetos inutilizáveis — como cadeiras quebradas, pedaços de madeira, e outras sobras de  exposições que não podem ser jogadas fora — identificamos algumas coisas que podem vir a ser parte do espaço expositivo da Temporada de Projetos na Temporada de Projetos:
  • 25 cadeiras de plástico
  • 4 mesas pentagonais
  • 1 tampo de mesa
  • 4 “puffs”
  • carpete azul e marrom
  • 1 poltrona com dois braços
  • 1 poltrona sem braço
  • 2 poltronas com um braço só
  • bancos de madeira
  • 1 sofá
A partir dessa “expedição”, o Álvaro ficou de nos fazer uma proposta para uma exposição com 300 projetos e encontros presenciais (considerando um público formado por 30 a 50 pessoas).
Sofá encontrado

Sofá encontrado

Poltrona encontrada

Poltrona encontrada

em: 22/05/2009

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encontro

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Encontro com Cauê Alves

Fomos na Rua Maria Antonia nos encontrar com o crítico, curador, e professor Cauê Alves para esclarecer a ele como gostaríamos que ele orientasse o workshop de curadoria que planejamos para a Temporada de Projetos na Temporada de Projetos. Além fazer parte da equipe de jovens críticos da Temporada de Projetos 2009 (acompanha o artista Maurício Ianês), o Cauê Alves foi também júri de inúmeras seleções em editais e salões de arte (inclusive no Paço das Artes, onde também participou de pré-seleções). Ele entendeu muito rapidamente nossas intenções com a exposição, que não é uma exposição sobre “salão dos recusados”, “inclusão de todos”, ou “crítica institucional”, o que segundo ele já foi feito muito por artistas principalmente nos anos 70, e sim sobre projetos artísticos e reflexões sobre o que é curadoria e processo de seleção. Inclusive, quando sugerimos que por meio da exposição o público, tendo uma maior variedade de  ’opções’, poderia fazer sua própria curadoria ao selecionar o que quer ver, o Cauê Alves contestou: “Curar é diferente de selecionar. Você não pode ir até o supermercado, escolher alguns produtos e dizer que você está fazendo uma curadoria!”, apontando para uma banalização crescente do conceito de curadoria, “toda curadoria envolve seleção, mas nem toda seleção envolve curadoria”, já que uma curadoria envolve ainda conhecimento, pesquisa, proposta, projeto, acompanhamento… Ele comentou como funcionavam as JACs (Jovem Arte Contemporânea), levadas a cabo por Walter Zanini nos anos 70 no MAC (Museu de Arte Contemporânea), para as quais não havia critério de seleção, os inscritos eram selecionados por sorteio. Segundo Cauê Alves, Zanini dizia que não havia critérios de seleção suficientes para dar conta das inscrições, ou seja, seria impossível escolher entre os inscritos e o sorteio era a única forma possível de fazê-lo. Ele mencionou um trabalho de Genilson Soares no qual ele selecionava todos os inscritos para o sorteio. De qualquer modo, durante a nossa conversa ficou claro que o nosso interesse não são as “utopias de inclusão” (como colocou Alves), e sim um uma reflexão sobre mecanismos de produção e também de curadoria. Ele se interessou bastante pelos formatos que estamos propondo que, segundo ele, se assemelhariam a uma espécie de ‘grande congresso’ sobre arte. Mais especificamente em relação aos workshops, ele fez uma colocação muito instigante que foi a possibilidade de aceitar também projetos de curadoria nos workshops de projetos, algo que não nos tinha ocorrido antes.
" Você não pode ir até o supermercado, escolher alguns produtos e dizer que você está fazendo uma curadoria!"

"Você não pode ir até o supermercado, escolher alguns produtos e dizer que você está fazendo uma curadoria!"

Ele também nos alertou para o “método” de inscrição nos workshops, afirmando que quando a atividade oferecida é gratuita, muita gente se inscreve mas não comparece no dia, e assim, seria interessante elaborar estratégias para garantir o comprometimento de quem se inscrever, e sugeriu a criação de uma lista de espera e talvez um período curto para as inscrições; mesmo que ele tenha compartilhado uma dúvida se realmente um workshop de curadoria atrairia muito interesse, que nós dissemos acreditar que sim por acreditarmos (e conhecermos) jovens curadores que se interessariam. Atônito, ele exclamou que ele era um “jovem curador”! Pensamos com o Cauê Alves um workshop de duração de dois dias, e 3 horas cada dia, em que os participantes terão a possibilidade de entrar em contato e compreender algumas das características da realização de uma curadoria na condição de jurado de projetos. As experiências anteriores dele em seleção proveriam o conhecimento prático para analisar os projetos, até mesmo de um ponto de vista mais “institucional”, já que, segundo ele, existe um equilíbrio entre uma descrição muito genérica e uma muito específica de um projeto, um certo “nível de projetualidade”; o primeiro caracterizando um pedido de “carta branca” para a atuação do artista e o segundo uma apresentação que não configura de fato um projeto, mas sim algo já muito mais determinado do que o que se esperaria de um. Uma possibilidade discutida para o formato é que os participantes sejam colocados na posição de júri, visando a reflexão e a prática da atividade julgadora e curatorial pela vivência desse processo, utilizando os projetos da exposição como material bruto, e de origem real, a ser trabalhado. Uma dinâmica possível, que ele próprio já vivenciou, é dividir os projetos entre os participantes para que eles os analisem separadamente e depois façam pequenas apresentações sobre o que leram, algo comum em seleções por júris coletivos. Essa dinâmica poderia ser precedida por uma prática coletiva na qual seria feito uma espécie de “estudo de caso”, com um projeto-modelo, permitindo assim uma maior clareza e autonomia num segundo momento no qual os outros projetos todos são analisados individualmente pelos participantes. Uma outra coisa que contamos para o Cauê Alves foi sobre a nossa tentativa de realizar no subsolo do Paço das Artes um encontro com os artistas inscritos no Edital do Paço das Artes, e portanto convidados a exporem seus projetos, para esclarecer aos interessados detalhes da proposta da Temporada de Projetos na Temporada de Projetos.  Pedido no começo do ano, esse encontro não foi autorizado pela equipe de produção do Paço das Artes e não foi realizado.
em: 13/05/2009

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encontro, realização

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Encontro com Ricardo Basbaum

Formato ‘palestra’ Começamos, como sempre fazemos, explicando o projeto, suas origens e objetivos. Como estavamos fazendo um convite ao Basbaum para que participasse da plataforma que chamamos de “palestras”, tentamos explicar que usamos esse nome apenas por falta de um nome melhor. Isso pois nos interessa pensar o formato desse tipo de comunicação, o que significa que pedimos aos convidados que reflitam sobre ele também e tragam propostas de como abordá-lo que se adequem o quanto melhor aos seus próprios perfis. Qualquer que seja a escolha de formato, a única coisa que deixamos claro que não teremos são ‘leituras de textos’ realizadas pelos palestrantes, o que costuma acontecer muito em seminários e simpósios. Estamos pedindo aos convidados que escrevam textos, mas para que sejam publicados no site antes que o encontro aconteça, com o intuito de que o encontro já possa partir do texto e começar com a discussão que costuma acontecer após a leitura. Outro padrão que gostaríamos de evitar é o da organização palco-platéia, no qual a quem fala lhe é instituído o ‘direito de falar’ por meio de uma hierarquia definida pelas condições físicas (palco, stand, etc.) ou a posse de um determinado equipamento (o microfone, a câmera, etc.). Basbaum se mostrou muito interessado nessa abertura e contou sobre suas experiências anteriores em explorações de formatos, para os quais Vito Acconci e John Cage foram referências. Numa, em um evento em Belo Horizonte, ele realizou uma apresentação na qual praticava alternadamente duas falas diferentes, sendo uma em uma mesa em um tom e outra, numa mesa ao lado, em outro tom; numa ele comentava informalmente alguns trabalhos seus e em outra lia alguns de seus textos. Ele também se interessou em explorar configurações espaciais, com demarcações no chão ou mesmo por meio da organização das cadeiras. De qualquer forma, lhe interessaria que essas demarcações não inibissem a fala dos outros, não fossem mirabolantes, pelo contrário, lhe interessa criar uma proximidade e informalidade do contato. Outras possibilidades levantadas foram a de ter textos enunciados por outras vozes e também utilizar recursos de sonorização como tipos diferentes de microfone, terminar com o texto ao invés de começar com ele, ou mesmo determinar uma organização espacial com a presença de mais de um microfone. De qualquer forma Basbaum se mostrou bastante interessado pela possibilidade de mostrar algo num evento cujo formato é maleável, para o qual o convite de participar vai além de um interesse no texto do participante ao considerar também o modo da fala. Artista-etc. Conversamos um pouco também sobre o conceito de artista-etc. Basbaum nos esclareceu que essa idéia não pretende sugerir que o artista possa ser um “multi-profissional”, ou seja alguém que transita por várias práticas de forma desligada. Pelo contrário, para ele o artista-etc é uma estratégia adotada pelo artista, que, na condição de artista, assume outros papéis e demarca dentro deles qual é o lugar do artista (que não se limita ao ateliê, por exemplo). De uma maneira mais genérica, isso é dizer que ser artista é suficiente para poder desempenhar qualquer outro papel, pois o artista tem flexibilidade para atuar no processo que quiser, já que seu lugar dá conta de todos eles. Segundo Basbaum há cinco textos seus que dão corpo ao conceito de artista-etc e formam um conjuto de pensamento sobre o assunto: 1 – Seminário na 27ª Bienal de São Paulo, sobre o artista belga Marcel Broothaers. 2 – “Artista como curador”, texto publicado no catálogo do Panorama do MAM de 2001. 3 – “E agora?”, texto publicado na revista Arte & Ensaio, n. 9, de 2002, que fala sobre a revista Item e o espaço Agora. 4 – Um depoimento seu em um evento no CEIA em Belo Horizonte, disponível aqui. 5 – Texto da “The Next Documenta Should be Curated by an Artist“. NBP Quando falamos sobre o NBP, Basbaum deixou claro que se trata de um projeto. Como a idéia se expressa, de um modo ou de outro, há mais de 20 anos em vários de seus trabalhos, o todo forma um grande processo no qual um trabalho se alimenta no anterior e cresce na medida em que novas explorações são realizadas. Além de ser um grande projeto é também um projeto que não tem fim. Comentamos que isso gera, para o público, uma carência de informação (o conhecimento de todo esse processo). Basbaum replicou dizendo que não acredita que seja ele que tenha que prover essa informação, já que esse tipo de lacuna é estrutural, não está só no trabalho dele e também faria (e faz) com que uma determinada produção não possa caminhar, o que significa que se for internalizada obriga a produção a estar sempre na estaca zero, e por isso mesmo tem que ser superada (para que a produção se desenvolva). Sobre a sua exposição na galeria Luciana Brito, Basbaum contou que seu trabalho sempre foi muito independente das galerias, mas que isso nunca foi uma escolha ou posicionamento ideológico seu, aconteceu simplesmente pois não existia interesse em seu trabalho por parte dos galeristas e ele não se sentia na obrigação de formatar sua produção para que eles se interessassem, já que conseguia a relação com as pessoas que se bastavam (em projetos como “eu-você”). Sua maneira de trabalhar já se configurava distante do mercado desde a década de 80, quando ele fazia um trabalho que diferia muito do mainstream da época (i.e. a pintura, que ainda é considerada por muitos como a única produção de então) e quando, segundo ele, o mercado era muito agressivo e tacanho.
Joaquin Torres García - América invertida

Joaquin Torres García - "América invertida"

Imagem para o SITAC 2009, criado por Ricardo Basbaum

Imagem para o SITAC 2009, criado por Ricardo Basbaum

Nesse ponto, ele mencionou sobre a sua relação com os profissionais de outros países, fora do Brasil, com os quais, por motivos que ele disse desconhecer, já conseguiu desenvolver vários projetos. Basbaum mencionou o simpósio SITAC 2009, “South, south, south, south”, para o qual Cuauhtemoc Medina o convidou para criar um diagrama para ser um emblema do evento. O diagrama tomaria como referência o mapa de Torres García e representaria o pensamento do evento. Segundo Basbaum até o próprio Medina se espantou quando soube que era a primeira vez que ele era convidado para uma contribuição desse tipo, algo que Basbaum tentou explicar dizendo que os olhares de fora são mais generosos e possibilitam outras oportunidades, sem a tendência de cristalizar uma determinada posição para que os profissionais ocupem, como ocorre na origem onde se assume uma prática (o lugar onde se vive). Basbaum também comentou sobre as diferenças no tempo de retorno para os trabalhos. Segundo ele há no Brasil uma latência muito grande, uma demora entre o momento em que uma obra é realizada (apresentada) e o momento em que ela gera alguma resposta, recebe um retorno. Essa latência não existe na Europa ou nos EUA, o que torna o trabalho no Brasil muito cruel em relação ao que é realizado lá onde o tempo é diferente e as coisas se realizam de modo mais direto. No Brasil é necessário aprender a ser artista e trabalhar num nível muito alto de abstração, lidar sempre com a possibilidade de frustração e evitar ao máximo criar um rancor em relação a tudo o que se espera (das obras, dos pares, do meio, etc.) e ter consciência que as estruturas existentes não dão conta de absorver (ou demandar) a produção, não é suficiente atuar somente no mercado, na galeria. Esse modo de trabalhar muitas vezes não é compreendido por quem vive e atua no eixo EUA-Europa. Economia de projetos Mesmo com as experiências no Brasil e no exterior, Basbaum comentou que existe, de um modo geral, uma economia de projetos que alimenta o circuito hoje, como uma espécie de mais-valia imaterial por meio da qual as instituições se alimentam da promessa de que os artistas trabalham de graça. Ele chamou a atenção para que comparemos a economia da arte contemporânea com a do cinema ou a da música popular, vendo que a da arte é muito estranha e arcaica, sendo muito complicada de lidar ou mesmo intervir. Ele comentou três casos pessoais específicos: o da Documenta de Kassel, o da sua relação com a galeria e o de sua participação em um evento de palestras dentro de uma instituição que funciona com dinheiro da iniciativa privada (uma grande empresa). No primeiro caso, o da Documenta, o espantoso é que não há cachê para os artistas participantes. O que acontece é que a cidade ganha com o turismo, o comércio ganha com o aumento das vendas e assim por diante. Mas às pessoas que impulsionam tudo aquilo se dá só a subsistência (passagens de avião, hospedagem). No segundo caso, só se ganha quando há venda. Mesmo assim existe toda uma economia que gira em torno da produção e apresentação da obra e para a qual não há acesso do artista se a venda não se efetivar. Os montadores ganham, os administradores da galeria ganham, secretários e secretárias ganham, quem aplica o vinil na parede ganha, até os garçons que servem bebidas na vernissage e os fotógrafos ganham. Mas o artista vive na promessa da venda, trabalha de graça e sem nenhuma remuneração pelo trabalho já feito. Finalmente, no último caso, há uma pequena remuneração, mas acontece que a contrapartida para quem investe é imediata e muito poderosa, um ganho em imagem (propaganda). Segundo ele, havia muitas pessoas no evento, que era gratuito para o público, além de toda a divulgação na imprensa e qualquer futura referência que se faça a ele, já que todo o material ligado a ele (distribuido gratuitamente) carregará a marca do patrocinador. Basbaum comentou que até pensou em contratar um economista para calcular qual o ganho de imagem que um investidor ganha em um evento desses e quanto de lucro uma ação como essa representa em relação a um outro tipo de investimento em imagem (numa ação como a publicidade tradicional, por exemplo). Para concluir este post, aqui está um texto ilustrativo que a artista Lenora de Barros nos enviou (não sabemos a origem exata, mas pode ser encontrado aqui):

“De qué viven los artistas?

Toda exposición de carácter institucional se organiza en torno a la obra realizada por un artista. En su organización participa toda una serie de personas necesarias para llevarla a cabo: transportistas, montadores, seguridad… pero:

¿Cobra el transportista? SÍ ¿Cobra el montador? SÍ ¿Cobra el vigilante? SÍ ¿Cobra el artista? NO

El trabajo de los artistas no se remunera porque se considera que su participación en la exposición contribuirá notablemente a su promoción, pero también se promocionan los comisarios, diseñadores y sobre todo la propia institución. Pero:

¿Cobra el comisario? SÍ ¿Cobra el diseñador? SÍ ¿Cobra el funcionario? SÍ ¿Cobra el artista? NO

Un artista, mediante su participación en una exposición institucional, contribuye con su trabajo a construir políticas culturales, igual que el catedrático contribuye a crear políticas educativas, el médico de la Seguridad Social sanitarias o el inspector de hacienda económicas, pero:

¿Cobra el catedrático? SÍ ¿Cobra el médico? SÍ ¿Cobra el inspector? SÍ ¿Cobra el artista? NO

Luego entonces… ¿De qué viven los artistas?”

Encontro com Fórum Permanente

Já na primeira reunião que tivemos no Paço das Artes, a equipe de produção nos sugeriu entrar em contato com o Fórum Permanente para uma possível parceria na divulgação do evento, afirmando algumas similaridades do nosso projeto com as atividades do Fórum. Após um contato via e-mail com a equipe do Fórum, Martin Grossmann, Ana Letícia Fialho, e Graziela Kunsch, marcamos um encontro no Centro Cultural São Paulo para pensarmos como essa parceria poderia acontecer. No encontro, bastante breve devido à atrasos e problemas no CCSP, falamos sobre o andamento do projeto, e sobre como planejamos os workshops, as palestras, e o site como parte da curadoria. Comentamos o módulo de palestra “Curadores, artistas, etc” em que pensamos os limites entre a atividade curatorial e a prática artística, colocando a própria Temporada de Projetos na Temporada de Projetos em questão. O Martin Grossmann falou sobre a seção “Rede” do site do Fórum Permanente que contém projetos cujas propostas se assemelham às atividades do Fórum. Entre eles está a curadoria OIDAIRADIO, selecionada na última Temporada de Projetos do Paço das Artes. O Martin sugeriu que a Temporada de Projetos na Temporada de Projetos também criasse um espaço na “Rede”. Além disso, a equipe do Fórum nos perguntou sobre os relatores dos encontros que planejamos ao longo da exposição. O Fórum costuma a publicar relatos reflexivos de palestras e debates, o que enriquece o seu arquivo. Explicamos que, por enquanto, nós estamos dando conta dos relatos para este blog, porém, como o número de encontros que irão acontecer nos meses de outubro e novembro são muitos, seria importante contar com outros relatores, e isso o Fórum Permanente poderia organizar e divulgar (porém não custear). Em outra ocasião, nos perguntaram como estava o processo da vinda do Boris Groys para o Brasil e que o fórum tem um registro em vídeo da palestra do groys quando ele veio a primeira vez ao país, em 2006, para participar de um ciclo de debates denominado “Práticas Artísticas Experimentais em Museus?“ na exposição ” Lygia Clark: Do Objeto ao Acontecimento; Somos o molde, a você cabe o sopro”, realizada na Pinacoteca do Estado de São Paulo. Foi bastante surpreendente descobrir, após o acesso ao vídeo, que a palestra que ele deu na ocasião da exposição sobre a Lygia Clark era justamente o texto “The Loneliness of the project” que ele nos enviou em janeiro de 2009 — ainda mais pelo fato de já termos procurado exaustivamente referências sobre ele na internet e este vídeo nunca ter aparecido.

Sobre a ‘autorização de uso’

Desde o início da realização da Temporada de Projetos na Temporada de Projetos, sabíamos que haveria necessidade de uma ‘autorização de uso‘ para a exposição dos projetos dos artistas. Tal autorização deveria ser elaborada junto à assessoria jurídica do Paço das Artes. Em março de 2009, a primeira versão dessa autorização nos foi enviada como uma adaptação do termo de uso de obra para as exposições que ocorrem no Paço das Artes. A obra, no caso da Temporada de Projetos na Temporada de Projetos, seria o projeto. Tivemos um problema na formatação dessa primeira versão. Era incompreensível onde o artista convidado deveria preencher os seus dados. Nos foi enviada assim:
LICENCIANTE: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx (em artes: xxxxxxxx xxxxxxx), (estado civil), (profissão), portador da cédula de identidade RG nº ____________ e inscrito no CPF/MF sob o nº ______________, residente e domiciliado na (endereço completo).
Pedimos para a Nathalia Meyer, da equipe de produção do Paço, alterar tal formatação e uma reunião com o advogado do Paço das Artes, o Abraão Mafra, foi necessária. O Abraão afirmou que a versão que nos foi enviada era uma versão muito antiga de termo de uso de obra, e que o termo utilizado hoje tem a formatação como nós gostaríamos:
Nome(“LICENCIANTE”):………………………………. RG:……………………………CPF/MF:………………….

Endereço:………………………………………………….

Telefone:…………………………………………………..

O problema foi que mesmo após a reunião que tivemos com o Abraão tivemos que esperar mais alguns dias, por conta dos feriados de abril, para ter uma segunda versão. E essa segunda versão também veio com alguns problemas, pois se referia a Temporada de Projetos na Temporada de Projetos como uma “instalação fotográfica” ao invés de uma curadoria.  Enfim, dia 5 de maio conseguimos fazer todas as adaptções necessárias e dia 6 de maio enviamos a todos os artistas inscritos no Edital Temporada de Projetos 2009, menos aqueles que já haviam recusado o convite. Demos o prazo para receber todas as autorizações até 8 de junho. E ficamos esperando!