O núcleo educativo do Paço das Artes organizou um encontro com os artistas que estão expondo na Temporada de Projetos 2009, Regina Parra, Claudio Matsuno, e Sérgio Bonilha e Luciana Ohira, para um bate-papo com educadores e interessados. O objetivo desse encontro, que faz parte do Projeto Portfólio, era que os artistas falassem sobre suas obras em exposição, mostrassem trabalhos anteriores, obras que considerassem referenciais e relatassem suas trajetórias e expectativas.
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Às 15:20hs o Paço já estava com bastante gente que iria participar do encontro. Por causa da chuva forte que caiu em São Paulo nesse dia, muitas pessoas ficaram presas no trânsito e o evento acabou sendo atrasado em uma hora.
Às 16h00 Regina Parra iniciou a sua apresentação. Começou contando a sua experiencia com teatro, quando aluna do curso de artes cenicas da ECA-USP e integrante do grupo do diretor
Antunes Filho, o
CPT. Ela comentou que foi no CPT que entrou em contato com muitos daqueles que considera referências suas hoje, como
Godard,
Tarkovski,
Kazuo Ohno,
Sokurov e
Pina Bausch. Com o Antunes ela contou que aprendeu que “antes do ator, existe o homem”, ou seja, que “como artista não basta fazer uma coisa que não tem a ver com a vida, é preciso estar aberto para outras coisas”, disse.
Regina foi morar no Rio de Janeiro, e enquanto trabalhava de garçonete fez cursos na
Escola Parque da Lage. Voltando para São Paulo, trancou a faculdade de artes cênicas e ingressou no curso de artes plásticas da
FAAP. Seus interesses no inicio eram o desenho, o vídeo e a fotografia. A pintura só lhe veio despertar o interesse a partir da sala do pintor alemão
Luc Tuymans,
na 26a Bienal de São Paulo, em 2004.
Depois dessa influência ela contou como foi o processo da criação da sua primeira pintura, que surgiu a partir de uma fotografia. Segundo ela, a intenção foi partir da fotografia para a pintura para poder realçar características presentes na primeira através da segunda; mais precisamente, torná-la mais dramática.
O resultado desse busca acabou sendo uma série de 12 pinturas realizadas a partir de fotografias de pessoas em frente à Igreja de Aparecida do Norte, com o qual ela ganhou o primeiro prêmio da
38a Anual de Artes da FAAP. Segundo a Regina, foi a partir desse prêmio que surgiu um convite para ser representada em uma galeria, o que ela considera a sua entrada no “circuito da arte”.
Ela prosseguiu contando mais sobre as séries de pinturas que se seguiram, como “Vertigem”, na qual são pintadas pessoas em momentos de horror, mas sem que ele fique explícito, sempre pinturas advindas de fotos familiares, ou com uma aparência familiar, mas ao mesmo tempo ambígua. A série seguinte “Devir” trata de momentos em que algo conhecido vai acontecer, mas que não contém a informação do que vai acontecer; segundo a Regina a busca seria então por esclarecer se a imagem já contém a tensão do fato que acontecerá ou se são os espectadores que imprimem essa tensão. A série seguinte, chamada “Controle”, utiliza imagens captadas por câmeras de vigilância. Novamente, segundo a Regina, a intenção era explorar a efemeridade das imagens descartáveis captadas por essas câmeras no processo de pintura à óleo. Além disso, existia ainda um interesse pelas imagens midiáticas (de uma grande coleção de recortes de jornais que ela mantém), já que as figuras da série “Controle” eram pessoas como a Princisa Diana e outras, em momentos antes de uma grande tragédia. Essa recorrência da tragédia a Regina atribuiu à sua formação no CPT e o interesse e estudo que lá existia pelas tragédias gregas.
Finalmente, ela falou sobre “Mise-en-scène”, série de pinturas expostas no Paço. O processo se dá novamente pela utilização de imagens de câmeras de segurança, mas, dessa vez, são imagens capturadas por uma assistente quando a própria Regina entra em cena. A busca seria então por um momento de dúvida entre o que é encenado e o que é real. Ela terminou referenciando Arlindo Machado, que, segundo ela, diz que as imagens de câmeras de segurança criam automaticamente suspeitos e culpados, em imagens que estão em estado constante de alerta, onde, a todo momento, algo pode acontecer.
Depois da fala da Regina, foi a vez de Claudio Matsuno mostrar trabalhos antigos. Ele começou com trabalhos de 1993, época em que estava na faculdade, que segundo ele eram trabalhos muito academicos que seguiam uma tradição da arte (exercicios de luz e sombra, cor, modelo vivo, releituras de obras, etc). “Durante a faculdade nunca tive experiencias de bienal”, afirmou. Segundo o artista, ele não tinha a intenção de ser artista, pensava em trabalhar com arte educação. Foi a partir de 1994, quando ele começou a frequentar mais o circuito artístico contemporaneo e ter contato com grupos como a
Casa 7, que se interessou mais em atuar como artista. Com influencia da arte alemã tais grupos faziam uma pintura que era, segundo Matsuno, “meio suja”. Outro artista referencia para a formação de Matsuno foi o pintor espanhol
Antoni Tapies que não tinha preocupação de esconder os erros. O erro, o improviso e a “tosquisse” se tornaram objetivos dos trabalhos de Matsuno. Da pintura, o artista tentou recuperar o habito do desenho: “e aí deu certo”. Mas afirmou a dificuldade e o seu desinteresse em decidir por um “estilo”, por uma linguagem específica. Outra comentário que o artista fez, foi em relação à sua prática de ateliê: “Muita gente acha que ateliê é coisa ultrapassada, mas eu não vejo nenhum problema.”
Em 2003 Matsuno passou a ser representado pela
galeria Leo Bahia, em Belo Horizonte. Realizou exposições no Centro Cultural São Paulo (2006), na
galeria ACBEU, em Salvador 2007), entre outras.
O artista disse que suas obras atuais não são trabalhos finais, e sim processos, em que “força” um diálogo de um trabalho para outro. Além disso, disse que nelas não existem questões filosóficas, um motivo pelo qual as faz, e sim questões plásticas, baseadas na busca pelo erro: “acerto quando eu erro”. E em relação à linguagem do desenho também afirmou: “não quero ser muito inovador. Não estou trabalhando com a novidade.”
Já no final da sua apresentação, Claudio Matsuno falou sobre projeto e elaboração de seu trabalho: “não é o que você coloca no portfólio que é o que vai aparecer no trabalho – o espaço influencia muito.”
Uma professora perguntou ao artista como ele, como professor de artes, trabalhava a questão do erro em sala de aula. Matsuno sugeriu ver o erro como processo do desenho.
Já estava tarde e alguns grupos de pessoas que estavam no encontro tiveram que ir embora. Na fala do Sérgio Bonilha e da Luciana Ohira formou-se uma platéia menor que pode ficar mais próxima aos artistas e participar de uma conversa mais informal. A dupla iniciou contando experiencias anteriores ao ingresso no curso de Bacharelado em Multimídia e Intermídia da
Faculdade de Artes Plásticas da ECA-USP: os dois falaram da importância da visita à museus de arte desde pequenos, a Luciana exibiu imagens que fez em laboratório fotográfico, e o Sérgio falou do seu contato com o grafitte, entre os seus 14 e 18 anos. Os dois se conheceram na faculdade e começaram a elaborar trabalhos juntos a partir de 2004, muitos deles surgiram desde de provocações dos editais. É o caso do 13° Salão Unama de Pequenos formatos, em que os artistas, instigados em saber o porquê e o como fazer um trabalho de pequena escala, criaram um museu em miniatura.
Ainda sobre a faculdade, Bonilha afirmou ter obtido um suporte técnico-formal, “mas era um universo muito fechado, ficou a lacuna do homem”, completou. Foi somente por meio da experiência com a área da educação que teve contato com um questionamento mais profundo sobre o mundo e começou a ler autores como
Foucault.
Das referências artísticas, a dupla citou os artistas
Guto Lacaz, que, segundo eles, tem um caráter generoso, humorístico e humano nos trabalhos, e os trabalhos de
Pedro Paiva e João Maria Gusmão.
Os dois comentaram um trabalho com lâmpadas queimadas que seriam transportadas por pelo menos 1000 km que já foi enviado para mais de 10 editais e nunca foi realizado. A partir desse trabalho falaram que existe uma plasticidade da
arte póvera nos trabalhos que realizam, no interesse pelo uso materiais ordinários como as lâmpadas queimadas.
Sobre projetos não realizados, Luciana e Sérgio citaram outro caso em que o projeto foi aprovado por um salão, mas os responsáveis pela mostra não conseguiram se organizar para que o projeto fosse executado.
Sobre a elaboração de Projetos, os artistas costumavam a escrever textos de apresentação mais densos, com referências à história da arte, mais academicistas, com nota de rodapé, introdução e conclusão. “Usávamos palavras difíceis como ‘imanência’, afirmaram. Depois que eles conheceram o
Lourival Batista, artista que entrou no Programa Rumos Itaú Cultural na edição de 2005-2006 e que usava uma linguagem muito mais coloquial para explicar seu trabalho, Luciana e Sérgio buscaram tornar os textos de seus projetos mais acessíveis e simpáticos.
Para um trabalho enviado ao 12o Salão dos Novos de Joinville, em 2005, os artistas abriram um edital divulgado por um periódico local para recrutar obras em miniaturas para um pequeno
museu de 1:100. Essa é uma idéia de um museu transportável. A obra ganhou o prêmio aquisitivo do Salão de Joinville, porém a aquisição regressou a expansão infinita originalmente planejada para o projeto.
Segundo os artistas, os trabalhos que eles vêm desenvolvendo têm uma características de mostrar como funcionam, elaboram máquinas transparentes, seguindo a idéia da
filosofia da caixa preta do
Vilem Flusser.
Luciana e Sérgio demostram uma constante preocupação com a relação com o público. Para uma exposição no
Centro Universitário Maria Antônia, realizada pelo Programa Nascente (da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP), na ausência de um serviço educativo, os artistas distribuíram ao público cartões com o endereço de um
website criado por eles, contendo informações sobre o trabalho exposto. Num outro contexto, no
Centro Cultural São Paulo, os artistas resolveram ampliar a proposta da exposição apresentando os desenhos prévios também utilizando os cartões e o
website.
A conversa com o Sérgio e a Luciana só terminou porque o Paço das Artes tinha que fechar. Já havia passado das 19hs e o evento tinha durado aproximadamente 4 horas!